Plenário

Câmara presta homenagem póstuma a motoristas assassinados

Vereadores também propõem debater legislação que garanta maior segurança a usuários e motoristas de aplicativos.

  • Período de Comunicações em Homenagem aos Senhores Moises Doring Jeske e Jairo Maciel, motoristas de UBER, falecidos em serviço. Manifestações nas galerias
    Outros motoristas de aplicativos mortos no trabalho foram lembrados nas galerias (Foto: Giulia Secco/CMPA)
  • Período de Comunicações em Homenagem aos Senhores Moises Doring Jeske e Jairo Maciel, motoristas de UBER, falecidos em serviço.
    Vereador Robaina, Lígia Carla, Helena Maria e vereadora Mônica na sessão desta tarde (Foto: Giulia Secco/CMPA)

A Câmara Municipal de Porto Alegre prestou homenagem póstuma, na sessão ordinária desta segunda-feira (1º/4), aos motoristas Jairo Maciel e Moisés Doring Jeske. Os dois profissionais eram motoristas de transporte por aplicativo da empresa Uber e foram assassinados durante o trabalho. Jairo Maciel, de 63 anos, foi encontrado pela polícia no dia 1º de abril de 2018, na Estrada do Rincão, no bairro Belém Velho. Ele estava desaparecido desde o dia anterior, quando aceitou uma corrida, chamada no bairro Restinga, e não foi mais visto. Os dois assassinos de Maciel foram posteriormente identificados pela 4ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa de Porto Alegre.

Já Moisés Jeske, de 33 anos, foi encontrado morto no Parque Chico Mendes, na manhã do dia 7 de março de 2017, sem o veículo que dirigia. O Honda Civic, usado no trabalho, apareceu abandonado em Viamão. Morador do bairro Sarandi, Moises Doring Jeske saiu de casa para atender uma chamada no final da noite do dia 6 de março daquele ano, desaparecendo em seguida.

Proponente da homenagem, o vereador Roberto Robaina (PSOL) entregou diplomas a Ligia Carla Leistner Pinheiro, esposa de Moisés Jeske, e a Helena Maria Noms Maciel, esposa de Jairo Maciel. A homenagem foi acompanhada por diversos familiares e amigos dos dois motoristas, bem como por trabalhadores dos serviços de transporte por aplicativo, que estavam presentes nas galerias do Plenário Otávio Rocha. Também estava presente à sessão o vice-presidente da Associação da Liga dos Motoristas de Aplicativos, Marcos Vinícius dos Santos.

Situação trágica

Para Robaina, o serviço de transporte por aplicativo vive uma situação trágica em Porto Alegre. "O assasinato desses trabalhadores expressa uma tragédia urbana vivida na cidade, com uma violência cotidiana em que os motoristas de aplicativos são uma das principais vítimas." Segundo ele, a violência fez com que os motoristas de aplicativos começassem a se organizar para defender seus direitos. Lembrou que houve intensa mobilização, no ano passado, para garantir a regulamentação deste serviço de transporte individual na Capital, mas trabalhadores de aplicativos se mobilizaram também para garantir mais segurança neste tipo de serviço, como a luta pela aprovação da emenda que exigia cadastro com foto dos usuários que paguem a viagem em dinheiro.

A emenda, aprovada pela Câmara, acabou vetada pelo Executivo municipal e teve o veto mantido pelos vereadores. "São vidas covardemente interrompidas. Esta homenagem visa a valorizar a luta dos motoristas por aplicativos por mais segurança e a das viúvas, por justiça pela morte dos esposos", lamentou Robaina. O vereador lembrou ainda haver um componente de luto e de luta para que as tragédias não sejam em vão. Ele disse igualmente acreditar que os familiares aceitaram participar da sessão pela perda e também acreditando em ser possível melhorar a segurança. “É a ideia de solidariedade e de organização dos trabalhadores".

Coordenando a sessão, a presidente da Câmara, vereadora Mônica Leal (PP), afirmou que, independente de se tratar de uma questão de interesse privado ou público, "o bem maior é a vida". Segundo ela, quando se trata de assassinatos decorrentes da falta de segurança, é preciso admitir "que há algo errado e rever a situação". Lembrando que 21 mortes já ocorreram depois que a opção do pagamento em dinheiro foi instituída no transporte por aplicativos, Mônica Leal disse que a Câmara precisa discutir formas de garantir segurança tanto para os profissionais motoristas quanto para os passageiros. "Nenhum governo no mundo quer carregar esta conta de mortes."

Lígia Carla Leistner Pinheiro, ao agradecer a homenagem e a presença dos motoristas dos aplicativos que ocuparam a galeria do Legislativo, lamentou que seu marido, o primeiro a morrer em assalto a motorista de aplicativo, foi seguido por mais 20 companheiros de profissão assassinados posteriormente. "Sinto a mesma dor da primeira experiência quando recebo a notícia de um colega de Moisés, morto em uma viagem de serviço". Já Helena Maria Maciel, esposa de Jairo Maciel, ao também agradecer a homenagem pediu: “Façam alguma coisa para garantir segurança dos profissionais. Meu marido está sepultado, mas não quero mais ouvir notícia de gente morta dentro de seus carros”. Ela disse acreditar em alternativas eficazes para melhorar a segurança.

Durante a homenagem, outros vereadores se manifestaram:

IDENTIFICAÇÃO - Aldacir Oliboni (PT) lamentou que a emenda aprovada pela Câmara e que exigia a identificação do usuário do aplicativo tenha sido, posteriormente, vetada pelo governo municipal. "Isso nos passa a ideia de que não é importante salvar a vida dos trabalhadores. A Câmara tem de rever esta injustiça, a segurança dos aplicativos não pode ser tratado como se fosse um assunto banal." Segundo ele, foram mais de 720 casos de assaltos ocorridos no ano passado. (CS)

LUCRO - Cláudio Janta (SD) disse que a regulamentação do serviço de transporte por aplicativo precisa garantir a vida das pessoas. "Quem lida com o público tem que ter saber quem está usando o serviço. É preciso dar condições de segurança e trabalho." Segundo ele, a Câmara havia aprovado várias emendas neste sentido, mas o lobby das empresas de aplicativo, visando cortar custos, acabou prevalecendo. Ele criticou o partido Novo por ter ingressado com ação na Justiça contra emendas que garantiam a segurança do serviço. "Em três meses, mais de dez trabalhadores de aplicativos foram mortos. A segurança tem de estar acima de qualquer lucro." (CS)

LIBERDADE - Felipe Camozzato (Novo) explicou que a ação judicial impetrada pelo seu partido, o Novo, visou a defender a liberdade de funcionamento do transporte por aplicativos. Afirmou que, na discussão do projeto que instituía o serviço na Capital, Cláudio Janta (SD) atuou em defesa dos taxistas e fez lobby para que aplicativos não pudessem atuar. Segundo ele, o Novo defende que o trabalhador dos aplicativos não precise pagar taxas excessivas à prefeitura e que não haja burocracia para a atividade. Salientou que o Novo pedia, na Justiça, a suspensão de alguns artigos do projeto enviado à Câmara "para preservar a liberdade de escolhas dos motoristas e passageiros". (CS)

LEGISLAÇÃO - Valter Nagelstein (MDB) disse lamentar as vidas interrompidas: "um marido que não está mais em casa, um filho, um trabalhador ausente. Uma vida encerrada". Conforme o vereador foram 60 mil mortes por ano no nosso país, fruto de um sistema que premia a impunidade. "Quando se mata um motorista que tem um pouco de dinheiro para satisfazer o vício de uma pedra para um assassino, isso é inadmissível. Essa Casa não pode ficar parada, nós vamos muito além. A legislação penal precisa mudar no Brasil". (PB) 

POLÍTICAS - Márcio Bins Ely (PDT) afirmou ser um dever nosso enfrentar esse tipo de situação para se encontrarem soluções. "Em qualquer profissão, infelizmente, isso acontece e temos que nos debruçar em políticas públicas para combater a violência". "Quando fazemos uma homenagem póstuma também queremos fazer uma manifestação para que possamos combater isso com movimentos legislativos", defendeu. O vereador informou que, através de pesquisa na internet, 87% das pessoas são favoráveis a identificação de passageiros nos aplicativos. "Não queremos mais que essa violência aconteça". (PB)

SEGURANÇA - Professor Wambert (PROS) falou ser esta uma homenagem de lamento e de tristeza e afirmou ser um dos maiores defensores dos aplicativos. "E nós lutamos aqui pela desregulamentação dos aplicativos. Agora vem aqui uma crítica, pois incentivamos os aplicativos, mas essa liberdade é de mão única, pois o motorista não tem o direito de escolher o seu passageiro", desabafou. Segundo ele a liberdade é só do empreendedor. "Não é uma roleta russa, isso é inadmissível. Como legislador, nós temos a obrigação de trazer isso a essa tribuna. Nas grandes capitais do mundo estimula-se o transporte público e aqui o transporte individual. As pessoas têm que deixar o seu veículo em casa, mas para isso temos que dar condições para isso. (PB)

RESPONSABILIDADE - Alex Fraga (PSOL) manifestou o seu apreço aos falecidos. "As pessoas precisam ser homenagedas enquanto vivas, não queremos mais essa situação. Temos que contribuir com a segurança dos cidadãos da capital". Disse que, quando muitos foram contra o serviço dos aplicativos na capital, ele foi a favor da regulamentação, principalmente no que envolve a segurança para os usuários e para os condutores. "Muitas das pessoas que hoje dirigem o aplicativo nos criticavam. Temos responsabilidade em contribuir com a sociedade para termos melhores condições de viver". (PB)

FAVORÁVEL – Airto Ferronato (PSB) afirmou que a homenagem aos motoristas de aplicativos mortos em serviço sugere a necessidade de reflexão sobre a segurança da capital, para as atividades desempenhadas na função. Segundo Ferronato, a atividade dos aplicativos se tornou de alto risco na Grande Porto Alegre. Para o vereador, a Câmara Municipal fica engessada por conta das legislações estadual e federal, porém aconselhou estudos para apontar onde o município pode intervir legalmente. (FC)

Textos: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)
           Priscila Bittencourte (reg. prof. 14806)
           Fernando Cibelli de Castro (reg. prof 6881)
Edição: Helio Panzenhagen (reg. prof. 7154)

 

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