Segurança

Comunidade da Restinga liga redução de serviços ao aumento da violência

Audiência Pública com a presença de lideranças locais foi realizada ontem à noite na sede da Acir

  • Audiência Pública para debater a Segurança Pública em Porto Alegre, realizada na Restinga.
    Vereadoras Nádia e Sofia e representantes da BM, da Polícia Civil, do MP e da OAB ouviram os moradores (Foto: Ederson Nunes/CMPA)
  • Audiência Pública para debater a Segurança Pública em Porto Alegre, realizada na Restinga. Ao microfone, representante da comunidade
    Roseli pediu que autoridades ouçam os jovens, “que têm muito mais a dizer sobre a violência” (Foto: Ederson Nunes/CMPA)

Na terceira das seis audiências públicas projetadas pela Câmara Municipal de Porto Alegre para debater a segurança pública na cidade e no Rio Grande do Sul, realizada na noite desta segunda-feira (4/6), no Bairro Restinga, a principal cobrança das lideranças presentes foi a de que a redução dos serviços prestados pela Prefeitura e pelo Estado na comunidade contribui para o aumento da violência na região. A reunião foi presidida pela vereadora Comandante Nádia (MDB) e contou com a participação de representantes da comunidade, do Ministério Público Estadual, da Brigada Militar, da Polícia Civil e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS). 

Ao abrir a reunião, Nádia destacou que as audiências foram idealizadas pelo presidente da Câmara, Valter Nagelstein (MDB), e pelo conjunto da Mesa Diretora. Informou que já foram contempladas com os encontros as regiões do 1º, do 11º, do 19º e agora do 21º BPMs e que outras duas reuniões ainda estão previstas para, ao final, resultar em um diagnóstico da situação a partir da manifestação das comunidades das regiões onde se situam os Batalhões de Polícia Militar em Porto Alegre. A região da audiência desta segunda-feira compreende, além da Restinga, os bairros Aberta dos Morros, Hípica, Lageado, Lami, Ponta Grossa, Chapéu do Sol, parte da Lomba do Pinheiro, Belém Novo e parte do Belém Velho. 

Para Jorge Cristiano Oliveira, da Comissão de Educadores Hip Hop Restinga, “o corte de investimentos em programas sociais, culturais e educacionais só pioraram a situação dos jovens”. Ele criticou o descaso das autoridades, que, mesmo acionadas, não interviram no processo que ocasionou o fechamento do Senai da Restinga, instituição de formação profissional que permitia "um futuro diferente do que aquele que é oferecido nas esquinas pelo tráfico”.

Roseli da Silva, presidente da ONG Renascer da Esperança, destacou a iniciativa da audiência, mas cobrou dos organizadores que é preciso ouvir os jovens, “que têm muito mais a dizer sobre a violência”. Para ela, é preciso que haja maior integração com as escolas. “Quem deveria estar aqui falando são os jovens de 8ª e 9ª séries e os alunos do Ensino Médio, que são aqueles que vão para as esquinas por falta de opção para alimentar as suas famílias, para poder se vestir e ter uma moradia digna”, ressaltou, lamentando que os políticos em geral, na sua opinião, só lembram da Restinga em época de eleição.

Na mesma linha dos demais, Almerinda Lima, representante do Fórum de Segurança da Restinga (FSR), afirmou que o trabalho dos órgãos de segurança tem sido eficiente, “mesmo levando em conta as deficiências de efetivo e estrutura disponíveis”. Para a líder comunitária, que tem atuação no FSR há oito anos, o problema está na ausência de um trabalho continuado dos governos. “Conheço todos aqui, dos dois lados, vivo o dia-a-dia do 21º Batalhão de Polícia Militar, da 16ª DP, e também da comunidade”, disse, ao destacar que segurança não se combate apenas com repressão e que a falta de investimentos em saúde, educação, transporte, cultura e lazer, iluminação pública e outros serviços são elementos que favorecem o tráfico na disputa pelos jovens. Almerinda ainda cobrou maior integração das autoridades municipais, tanto do Executivo como do Legislativo, com as lideranças locais.

Rogério Dekeches, funcionário público lotado no HPS e morador da Restinga, disse que é necessária uma maior fiscalização dos serviços de transporte na região, nos horários e condições dos coletivos, que, segundo ele, “com frequência, quebram no caminho”. Disse que os reparos na iluminação pública, área em que já atuou na Prefeitura, depois que foi terceirizada, não realiza mais a manutenção no sistema conhecido por “encontrada”, que, explicou, “é o envio de equipe para circular pelas ruas e ir realizando o conserto das luminárias com problemas que for encontrando no caminho”.  Por fim, lamentou a desvalorização dos servidores pela Prefeitura e a perspectiva de que o enfrentamento do governo municipal com o funcionalismo possa ampliar a queda na qualidade da prestação dos serviços.

Autoridades avaliam manifestações das lideranças

Recém-chegado ao comando do 21º BPM, o major Macarthur Vilanova explicou que promoveu algumas alterações no policiamento da Região, que, em oito semanas, já começam a trazer resultados positivos. “Estamos priorizando as paradas de ônibus nos horários de pico, pela manhã e ao final do dia, entre esse intervalo o comércio e após as 21 horas o patrulhamento das áreas residenciais”, informou. Ele afirmou que, nesse curto período, está integrado aos grupos de redes sociais e que, ali, diariamente tem feito balanço das ações da corporação às lideranças locais.

O delegado titular da 7ª DP, Gerson Nadler, lamentou a ausência de representantes da sua área de atuação (Lami, Lageado, Belém Novo e Ponta Grossa). Afirmou que está à frente da DP há um ano e meio e que, nesse tempo, deu ênfase ao combate à violência doméstica às mulheres. “Estamos fazendo todas as ações para garantir as medidas protetivas às vítimas, assim como a elaboração do inquérito até o seu encaminhamento à Justiça, em razão da distância dessas comunidades da Delegacia Especializada da Mulher”. Nadler ainda informou que os termos circunstanciados também foram assumidos pela 7ª DP pelos mesmos motivos, evitando o deslocamento das vítimas até a central na Cavalhada. “Muitas vezes, as pessoas não têm sequer recursos para a passagem”, justificou.

José Nilton Gosta de Souza, promotor de Justiça da Regional Restinga, representante do MP na audiência, afirmou que há um processo de integração da promotoria e os órgãos de segurança, com uma primeira reunião já realizada, com a finalidade de avaliar e encaminhar ações conjuntas para reduzir os índices de violência. Ele, no entanto, entende que a repressão aos crimes é necessária porque os processos apontam para frequentes trocas de tiros, atuação do tráfico, dificuldades de transportes entre os bairros. Citou o Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd), realizado pela BM, como um bom exemplo para educar os jovens.

A delegada Shana Luft Hatz, titular da 16ª DP, concordou com as afirmações dos representantes da comunidade de que a melhoria da Segurança “passa pelos pilares da prestação de serviços à sociedade, como a Educação e a Saúde”. Para ela, a presença do tráfico é real no dia-a-dia da comunidade e que “a droga é um mundo fácil para os jovens”. Cobrou mais investimentos em ações que possam concorrer com o tráfico para a redução dos índices, que considera “alarmantes”.

Presente à Audiência Pública a representação da OAB também entende que é necessária maior integração das autoridades com as lideranças locais. Leandro da Cruz Soares, disse que a entidade está de portas abertas para as entidades a fim de que ações conjuntas com a Ordem possam ser feitas em benefício da juventude da Restiga e bairros adjacentes.

A vereadora Sofia Cavedon (PT) alertou para o agravamento do problema a partir da desvalorização dos servidores públicos municipais pela atual gestão da Prefeitura. Disse que ficou claro pelas manifestações das lideranças locais que a prestação dos serviços é essencial para a redução dos índices de violência, mas que, na contramão disso, os projetos encaminhados pelo governo ao Legislativo, de cortes de benefícios e rendimentos, poderão piorar ainda mais a qualidade das ações já em falta na Restinga e demais bairros da cidade. “É cada vez maior a desmotivação e isso está levando muitos funcionários públicos a pedir licenças, exoneração e antecipar suas aposentadorias”, disse.

Texto: Milton Gerson (reg. prof. 6539)
Edição: Claudete Barcellos (reg. prof. 6481)