Cuthab

Vereadores irão tratar situação da Progresso com diretor-geral do Demhab

Medida busca garantir apoio do órgão para a suspensão de reintegração de posse de ocupação na Zona Norte

  • Reintegração de Posse da Comunidade Progresso, localizada no bairro Sarandi.
    Cuthab tenta solução para famílias da Progresso (Foto: Candace Bauer/CMPA)
  • Reintegração de Posse da Comunidade Progresso, localizada no bairro Sarandi. Na foto, a vereadora Fernanda Melchionna (ao microfone).
    Fernanda foi autora de projeto que criou AEIS no local (Foto: Candace Bauer/CMPA)

Uma audiência com o diretor-geral do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), Mário Marchesan, com o objetivo de que o órgão faça a análise técnica e política e emita a sua posição sobre a situação da Comunidade da Progresso, na Zona Norte da capital, para informá-la ao poder Judiciário a fim de impedir o avanço do processo de reintegração de posse, foi a principal decisão tomada, na manhã desta terça-feira (6/3), na reunião da Comissão de Urbanização, Transporte e Habitação (Cuthab) da Câmara Municipal de Porto Alegre. O encontro, presidido pelo vereador Luciano Marcantônio (PTB), tratou da situação de 110 famílias que vivem no local, a maioria delas formadas por imigrantes haitianos. 

Segundo a líder comunitária Ilisiane Vida Alves, porta-voz dos ocupantes, o problema piorou após o ingresso, pela prefeitura, de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a derrubada do veto a um projeto da vereadora Fernanda Melchionna (PSOL), que com emendas de diversos outros parlamentares, criou 14 Áreas de Interesse Social (AEI’s), entre elas da Progresso. Votada em dezembro de 2014, a matéria foi vetada pelo prefeito sob a alegação da falta de estudos técnicos e da realização de audiência pública. O veto foi derrubado em março de 2015 pelos vereadores e, em seguida, o governo ingressou com a Adin, acatada em medida liminar pelo judiciário.

A partir daí, explicou Ilisiane, houve várias mobilizações da comunidade, com o apoio de vereadores e dos movimentos sociais, que culminaram com a criação de um Grupo de Trabalho acompanhado pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) para, com o apoio do então vice-prefeito Sebastião Melo, estudar cada uma das 14 áreas e encontrar alternativas para o impasse. “Do total de ocupações, apenas uma, na Zona Sul, foi retirada do projeto original, por problemas ambientais”, disse a líder comunitária. Com base no resultado dos estudos, um novo projeto, desta vez elaborado pelo governo, foi enviado ao Legislativo, onde tramita sem ter sido votado até hoje.

De acordo com Ilisiane, a decisão interrompeu o pedido de reintegração de posse, mas os proprietários, “com a ajuda de uma construtora com interesse na área”, apresentaram um laudo que aponta para a contaminação do solo, anexando-o ao processo, o que colocou os ocupantes da Progresso, novamente, sob o risco de uma desocupação iminente. A reunião desta terça-feira teve como objetivo reabrir o debate sob a mediação da Cuthab para evitar o despejo. 

Para a vereadora Fernanda Melchionna, é inadmissível que ninguém tenha tomado providências quanto à notificação e cobrança da empresa causadora da poluição para que ela proceda com a descontaminação da área, “sob sua total responsabilidade e custeio”. Já Eduardo Osório, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, acredita que, no período em que for realizada essa operação, “o Demhab deve fazer a análise do cadastro social das famílias e encaminhá-las temporariamente ao programa de aluguel social”.

Outra informação, prestada pelos donos da área da Progresso no processo formado ao longo das discussões no CEJUSC, conforme Ilisiane, é a da existência de outra área próxima, essa de propriedade da prefeitura, que poderia ser utilizada para a transferência e solução definitiva para as 110 famílias. Entretanto, o terreno estaria sendo ocupado por um particular que mora no local e aluga o espaço para a realização de festas rave e rodeios. O vereador Roberto Robaina (PSOL) manifestou a sua contrariedade diante da agilidade e disposição para o despejo de famílias pobres, que buscam um espaço digno para moradia, enquanto um particular utiliza uma área pública para fins privados e lucrativos”.  

Ademir Maria, coordenador da Equipe de Cooperativismo do Departamento Municipal de Habitação da prefeitura de Porto Alegre, informou que o Executivo está buscando ampliar as parcerias com vistas a execução de projetos do Minha Casa, Minha Vida na capital. Sugeriu que a comunidade altere a condição jurídica da associação para uma cooperativa, considerando que, sob esse escopo, será mais fácil de encaminhar a demanda da Progresso.  

Paulinho Motorista (PSB), que foi o voto de minerva em março de 2015 para a derrubada do veto do então prefeito José Fortunati ao projeto inicial sobre as AEIs, disse que se orgulha da posição assumida. “Mantenho a minha disposição de estar ao lado da comunidade”, declarou. Na mesma linha, Isabel Rodrigues Wexel, coordenadora do Núcleo de Habitação da Defensoria Pública do Estado, colocou-se aos moradores.

Rafael Passos, presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, seccional RS, destacou que a situação da comunidade Progresso e das demais existentes na cidade se dá pela inexistência de uma política de regularização fundiária. “Sem demérito ao trabalho do Ademir, a presença, aqui, hoje, do coordenador da Equipe de Cooperativismo do Demhab, é prova disso. Aqui devia estar um servidor envolvido em projetos de regularização fundiária, um problema grave que precisa ser enfrentado em Porto Alegre”, manifestou.

Por fim, Juliano Fripp, do Conselho Regional Pela Moradia Popular, lembrou que a organização da Progresso só se deu após a mudança de postura da comunidade, que abandonou lideranças antigas, que visavam o lucro por meio de processos nas mãos de advogados sem credibilidade. Que a lei, inicialmente aprovada, foi tão boa que suspendeu 13 processos de reintegração de posse, sendo um deles em pleno feriado de sexta-feira Santa.

Fripp também criticou a posição adotada pelo ex-prefeito Fortunati. “Ela foi motivada em razão da iniciativa não ter partido dele”. Ainda que o processo de discussão foi indicado ao CEJUSC para que não caísse em uma vara do poder judiciário “comprometida com os interesses dos grileiros”, como se referiu aos proprietários da área. Para ele, “Porto Alegre e sua população pagou um preço alto pela inércia do poder público em cobrar medidas na Justiça para ocupações feitas por poucas famílias tradicionais da cidade, que se adonaram de terras públicas, loteando-as sem qualquer infraestrutura, o que é uma contrariedade à posição tomada hoje quando se tratam de famílias de baixa renda em busca de moradia”.

Finalizando o encontro, o presidente Luciano Marcantônio destacou o papel da Cuthab na mediação de situações como a da comunidade da Progresso. Disse que, apesar das diferentes visões político-ideológicas dos vereadores que integram a comissão, e dos convidados aos debates, o objetivo é o de encontrar consensos, desde que eles respeitem os preceitos legais. Colocou-se também à disposição para marcar a agenda com o diretor-geral do Demhab, diante de críticas de que essa solicitação é antiga e até o momento não teve resposta.

Texto: Milton Gerson (reg. prof. 6539)
Edição: Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)