Cedecondh

Sete em cada dez mulheres dizem não receber ajuda contra violência

Soluções apontadas para combater feminicídio são educação das crianças, acesso à informação e profissionalização feminina

  • Comissão se reúne para debater o Feminicídio.
    Reunião na Comissão apresentou dados sobre a violência contra a mulher (Foto: Elson Sempé Pedroso/CMPA)
  • Comissão se reúne para debater o Feminicídio.
    Participantes também apresentaram propostas para reduzir as agressões (Foto: Elson Sempé Pedroso/CMPA)

"O feminicídio é um tema que, infelizmente, tem demonstrado números alarmantes", introduziu o presidente da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) da Câmara Municipal de Porto Alegre, vereador Moisés Barboza (PSDB), ao destacar a relevância da pauta discutida pela comissão na manhã da última quinta-feira (4/7). O evento, que ocorreu em sala de reuniões do Legislativo Municipal, contou com a presença dos vereadores integrantes da Cedecondh; de representantes do Executivo; de psicólogas e advogadas na figura do Judiciário e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS); de delegadas e uma inspetora da Polícia Civil em nome da segurança pública da Capital; e dos demais interessados no assunto. 

Conforme a gerente distrital da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Ana Lúcia Dagord, ao falar do Movimento Feminista, disse que “o movimento imaginava que, com a criação da Delegacia da Mulher em Porto Alegre, em 1988, a violência diminuiria". Porém, Ana Lúcia citou pesquisas que confrontam esse pensamento. Lamentou que, infelizmente, “aquelas mulheres que denunciam são as que mais sofrem”. Que na maioria das vezes, as vítimas só procuram ajuda depois da quinta agressão; que existe a chamada “cultura das violências nas famílias” e a repetição viciosa dessa cultura dentro de um ciclo sem fim, de pai para filho. A gerente salientou, entretanto, proteção principalmente às famílias mais vulneráveis, “que são onde estão as mulheres com maior dificuldade”. “O município tem somente uma casa-abrigo. E a população, muitas demandas”, relatou.

A secretária de Desenvolvimento Social e Esporte (SMDSE), comandante Nádia Gerhard, abordou a violência intrafamiliar, a qual atinge não só a mulher, mas a família, os amigos, os vizinhos e até o ambiente profissional. No momento, Nádia enfatizou atitudes a serem tomadas. “A solução está na informação, na educação e na profissionalização feminina”, disse, ao questionar: “Como a mulher vai ter autonomia se ela não tem o mínimo de profissionalização?”. Para a secretária, “infelizmente há pessoas que ainda não sabem que bater em alguém ou, em uma mulher, é crime”. 

Judiciário

“A BBC fez um levantamento afirmando que, por dia, 47 mulheres são mortas em 21 países”, disse a advogada e presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB de Canoas/RS, Fabiane Xavier. “No ano de 2017, a Organização das Nações Unidas (ONU) fez um levantamento afirmando que, de 70 mil mulheres, 50 mil sofreram feminicídio íntimo”, informou. Para explicar, Fabiane ensinou que feminicídio íntimo é quando a mulher conhece o parceiro e, diferente disso, seria feminicídio não-íntimo. “Temos a Lei Maria da Penha, mas ainda temos muito a ser feito”, considerou a advogada ao recordar, também, o feminicídio cometido contra as mulheres negras (71% dos casos) e as transsexuais. 

“Antigamente, o direito civil brasileiro estipulava a mulher como um ser humano relativamente incapaz e, para tudo, ela precisava da autorização do marido”, rememorou a advogada e juíza aposentada Maria Isabel Pereira da Costa. A jurista também revelou que, em tempos passados, o homicídio de uma mulher poderia ser enquadrado como uma defesa da honra masculina. Maria Isabel reforçou, contudo, estarmos em outro momento da história. Embora a luta diária, a advogada clamou por um olhar especial para as crianças. “Elas são muito influenciáveis. Precisamos enxergar as presentes e futuras gerações”, pediu. “Crianças repetem qualquer tipo de violência. As pessoas violentas certamente foram violentadas quando crianças”, mencionou Maria Isabel, ao questionar: “E se criássemos uma estrutura com o intuito de educar?”.

Segurança

“Estamos tentando qualificar os dados, porque daí poderemos melhorar as medidas de prevenção”, justificou a delegada da divisão de proteção e atendimento à mulher da Polícia Civil, Cristiane Pires Ramos. Como descrito por Cristiane, “a cada dez vítimas de violência, sete nunca registram nenhuma ajuda”. Um exemplo sobre a organização dos dados apontados pela delegada é a transparência gerada. “Houve o aumento de feminicídios de 2017 para 2018”, indicou. Antes disso, Cristiane relatou que o crime constava no sistema como homicídio. “Da metade de 2018 para cá passamos a considerar, também, o feminicídio não-íntimo”, explicou. 

A inspetora da divisão de proteção e atendimento à mulher, Nathiana Viana Rech, apontou dados específicos do problema. Só em Porto Alegre, Nathiane falou que, de 2016 a 2019, houve o aumento de solicitação das medidas protetivas. Enquanto em todo o ano de 2016 foram registradas 7.779 ocorrências e 4.643 medidas protetivas; até este momento de 2019, 4.733 ocorrências e 3.076 Medidas Protetivas. No estado do Rio Grande do Sul, a inspetora afirmou que, até maio, “foram registradas 15.927 ameaças; 9.026 lesões corporais; 555 estupros; 34 feminicídios consumados; e 161 feminicídios tentados”. 

Vereadores

Na oportunidade, outro destaque também referido por Barboza foi a posição brasileira no crime de feminicídio: "Tive acesso às últimas pesquisas e, até então, o Brasil era o quinto país com o maior número de casos". Por isso, o parlamentar reforçou a necessidade dos debates sobre o tema. Disse que são vitais as definições acerca desse crime. Questionou os tipos de políticas públicas, as motivações e as ações a serem efetivadas. E considerou: "Precisamos nos unir para combatermos o feminicídio". 

A vereadora Lourdes Sprenger (MDB) lembrou os casos veiculados cada vez mais pelas mídias. Falou que o diálogo acerca do assunto tem que estar em toda a parte, "principalmente nas pontas, nas periferias". De acordo com a emedebista, muitas pessoas apanham, e não sabem que estão sendo violentadas ou o que isso significa. "Temos que denunciar", expressou Lourdes, ao observar: "A partir das denúncias é que as autoridades terão estatísticas e noções para enfrentar a violência contra a mulher".  

"Um tema sensível e urgente", definiu Cláudio Conceição (DEM). O vereador relatou que, por mais que a violência contra a mulher e o feminicídio sejam constantemente divulgados, "sempre descobrimos fatos novos e achamos isso desagradável". Para que haja mais efetivações, Conceição opinou no sentido de as teorizações serem menores e as ações, maiores. 

Marcelo Sgarbossa (PT) elencou os vários fundos existentes em Porto Alegre. Comentou, porém, que certa vez a Câmara protocolou um Fundo Para as Mulheres, “o qual foi à votação, e faltaram três votos para que fosse aprovado”. “Estamos tratando de um tema que não é de um ou outro partido político, mas de toda a cidade”, esclareceu Sgarbossa, ao falar da questão financeira e de amparo às vítimas de violência. 

No opinião do vice-presidente da Cedecondh, vereador Luciano Marcantônio (PTB), “o maior foco é priorizarmos a prevenção”. Com isso, o petebista sublinhou a educação de qualidade. Sugeriu o contato com a Secretaria Municipal de Educação (Smed) para a produção de “um trabalho efetivo com alunos, pais e professores”. A respeito da fala de Sgarbossa, mencionou que os fundos funcionam quando existem efetivos fiscais e que, para que haja incentivo, “o Executivo tem que fazer um encaminhamento”. Por fim, elogiou todas as mulheres dizendo: “Parabéns pela coragem e enfrentamento”. 

Texto

Bruna Schlisting Machado (estagiária de Jornalismo)

Edição

Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)