Servidores pedem negociação sobre mudanças propostas pelo Executivo
Audiência teve duração de três horas e meia. Municipários lotaram as galerias do plenário Otávio Rocha.
A Câmara Municipal de Porto Alegre realizou, nesta quinta-feira (21/3) à noite, uma audiência pública para debater o Projeto de Lei Complementar do Executivo (PLCE) nº 002/19, que propõe alterações no Estatuto dos Servidores Públicos do Município. Com as galerias do Plenário Otávio Rocha lotadas por servidores municipais, a audiência foi conduzida pela presidente da Câmara, vereadora Mônica Leal (PP), e abriu espaço para que representantes do poder público e das entidades presentes pudessem se manifestar na tribuna. Durante os pronunciamentos feitos, os servidores presentes à audiência pública gritaram palavras de ordem apelando pela abertura de negociação com o Executivo municipal a respeito das mudanças propostas no projeto. A audiência, que teve três horas e meia de duração, foi transmida ao vivo pela TV Câmara e pelo Facebook e pode ser acompanhada também em telão colocado no Auditório Ana Terra.
A proposta do Executivo propõe alterações em relação ao regime de trabalho dos servidores públicos municipais, aos acréscimos e gratificações, no que diz respeito à composição, concessão e incorporação de parcelas que compõem a remuneração praticada. O PLCE 002/19 está previsto para ser discutido e votado na sessão ordinária da Câmara na próxima segunda-feira (25/3) e, caso seja aprovado pelo plenário da Câmara Municipal e sancionado pelo prefeito, entrará em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial do Município.
Ao se manifestar na abertura da audiência, o presidente do Sindicato dos Servidores do Município (Simpa), Alberto Terres, apelou pela retirada do regime de urgência para a tramitação do projeto, a fim de que o diálogo pudesse ser restabelecido, e pediu que os vereadores e as vereadoras buscassem compreender o que a categoria iria expor durante as discussões. "Precisamos ser ouvidos. Somos importantes para a cidade, fazemos as políticas públicas acontecerem”, salientou Terres. Ele lembrou que os municipários, ao fazerem concurso, serem aprovados e chamados a assumirem cargos, passaram a planejar suas vidas a partir disso. “Servidores e servidoras se qualificaram para atender na saúde, na assistência social, na educação, no Dmae, no DMLU”, exemplificou. "Desde 2017 existe uma desconsideração por parte do gestor público quanto a essa qualificação e ao trabalho feito por servidores públicos." Terres lamentou ainda que o Executivo não tenha conversado sobre o projeto de lei com os servidores. "Tivemos que ingressar na Justiça para dialogar com o governo”, lembrou o diretor.
Ainda na abertura do evento, o secretário adjunto de Planejamento e Gestão, Daniel Rigon, apresentou gráficos com resultados financeiros da Prefeitura Municipal e afirmou que, entre 2012 e 2018, as despesas de pessoal dobraram. Rigon disse que entre 2017 e 2018, pelos cortes havidos nos gastos, além da redução de nomeação de cargos comissionados, esta despesa se manteve estável. Ele, contudo, afirmou que, pela falta de recursos e investimentos, "a sociedade sofre por não conseguir mais serviços, por não ter mais investimentos". Ainda em sua manifestação, o secretário, em defesa da proposta do Executvo, disse haver a necessidade de "fazer alguma coisa, porque (a prefeitura) vai quebrar".
Contra o projeto
A convite do Simpa, a economista Anelise Manganelli, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), e o presidente da Associação dos Procuradores do Município de Porto Alegre (APMPA), César Sulzbach, também manifestaram a contrariedade das entidades quanto ao teor do PLCE 002/19. Ao fazer uma breve apresentação dos estudos realizados pelo Dieese sobre as finanças do município, Anelise mostrou dados contrapondo a perspectiva de desastre orçamentário sustentada pela prefeitura municipal. Sobre o PLCE 002/19, a economista destacou que "o ataque aos servidores públicos não está acontecendo apenas em Porto Alegre", pois vem acompanhado de medidas do governo federal como a que limitou o teto dos gastos públicos e, em consequência, o acesso aos serviços públicos, a restrição do direito de greve e a demissão por desempenho. "É uma série de ataques aos servidores. E a reforma da Previdência propõe diminuir ainda mais os benefícios de quem já está aposentado."
Lembrando que uma parcela dos municipários ganha apenas R$ 960 mensais, Anelise destacou que a prefeitura acaba sofrendo as consequências por não conseguir entregar os serviços devido à ausência de trabalhadores. "Houve redução de 1007 trabalhadores (8%) entre 2017 e 2018. As entidades autárquicas perderam 309 trabalhadores no último ano. Enquanto o número de trabalhadores diminuiu, a população de Porto Alegre aumentou." Ela mencionou ainda o crescimento nominal de receita do Município e que o aumento da despesa com pessoal se restringiu, no período, a apenas 1,6%. Já o limite prudencial para gastos com o funcionalismo teria ficado em pouco mais de 48%, ainda dentro do limite aceito pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Salientando que apresentaria a "opinião técnica" da APMPA sobre o PLCE 002/19, César Sulzbach disse que a entidade fez várias reuniões e debates com as diversas associações representativas dos servidores do Município. Segundo ele, o projeto do Executivo faz "mudanças significativas" na carreira dos servidores públicos de Porto Alegre e "produzirá inúmeras injustiças" devido ao modo como foi concebido. "Ele tem um pensamento unicamente financeiro e de curto prazo. Deixa de analisar e pensar todas as carreiras do município." Sulzbach afirmou que os servidores não se furtariam a discutir uma reestruturação de carreiras mais condizente e salientou que as alterações propostas pelo Executivo atingem cerca de 25 mil servidores ativos e inativos. "Os aposentados também serão atingidos pelo projeto, nos termos em que ele foi encaminhado à Casa."
Sulzbach calcula que a proposta produzirá perda salarial ao redor de 55% ao longo de 40 anos para servidor técnico-científico. "Não há previsão de correção de valores, ao contrário do que afirma o Executivo. Além disso, a proposta rasga a lei aprovada em 2015 e que resolveu a questão do efeito cascata." O presidente da APMPA lamentou ainda que a prefeitura não valorize os servidores e afirmou que o projeto não foi submetido à análise do corpo técnico dos procuradores de carreira do Município antes de ser enviado à Câmara.
Pronunciamentos
Se manifestaram na tribuna do Plenário Otávio Rocha, contrários à proposta do Executivo, os ex-vereadores e atuais deputados federal Fernanda Melchionna (PSOL) e estaduais Thiago Duarte (DEM) e Sofia Cavedon (PT). Também falaram contra o projeto de lei: Marcelo Marsilac Matias, presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers); Felisberto Luisi, do Orçamento Participativo; Isabel Letícia de Medeiros, do Conselho Municipal de Educação; Fabiano Negreiros, pai de aluno da rede municipal; e Luciana Negreiros da Silva, do Simpa.
Outros pronunciamentos contrários ao projeto foram feitos por Carmen Padilha, professora da rede; Sinthía Santos Mayer, da Associação de Trabalhadores em Educação de Porto Alegre (Atempa); Adroaldo Bauer Corrêa, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul; e Alexandre Dias Abreu, do Núcleo Sindical do Dmae. Também se posicionaram contra o texto como está apresentado e pediram negociação com o Executivo os vereadores Airto Ferronato (PSB), Professor Alex Fraga (PSOL), Karen Santos (PSOL), Roberto Robaina (PSOL), Mauro Zacher (PDT), Aldacir Oliboni (PT), Cláudio Janta (SD), Marcelo Sgarbossa (PT), Engenheiro Comassetto (PT) e Adeli Sell (PT).
O vereador Valter Nagelstein (MDB) defendeu o diálogo sobre a proposta e criticou disparidades no plano de carreira dos servidores e os acúmulos percentuais atualmente existentes, apontando a necessidade de correções nas despesas de pessoal. Estiveram ainda presentes na audiência pública os vereadores João Bosco Vaz (PDT), Cláudio Conceição (DEM), Felipe Camozzato (Novo), Mauro Pinheiro (Rede), Ricardo Gomes (PP), Lourdes Sprenger (MDB), Cassiá Carpes (PP), José Freitas (PRB), Reginaldo Pujol (DEM), Alvoni Medina (PRB), Márcio Bins Ely (PDT) e Moisés Barboza (PSDB).
Texto: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)
Helio Panzenhagen (reg. prof. 7154)
Edição: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)