Segurança pública

Audiência debate os altos índices de criminalidade na Capital

Audiência pública teve grande participação da comunidade e de entidades Foto: Ederson Nunes/CMPA
Audiência pública teve grande participação da comunidade e de entidades Foto: Ederson Nunes/CMPA (Foto: Ederson Nunes/CMPA)
A Câmara Municipal de Porto Alegre promoveu, na noite desta quarta-feira (04/05), no Plenário Otávio Rocha, audiência pública para debater os temas polêmicos e preocupantes referentes ao alto índice de criminalidade e à falta de segurança pública, na capital gaúcha, com o objetivo de encontrar medidas viáveis e emergenciais para garantir um policiamento mais ostensivo e preventivo nas ruas. A iniciativa foi proposta pela mesa diretora da Casa, em articulação conjunta com a bancada do PT, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e a Comissão do Comitê Metropolitano de Segurança da Câmara Municipal. O presidente do Legislativo municipal, vereador Cassio Trogildo (PTB), coordenou a sessão.

A falta de efetivo adequado da Brigada Militar para atender a todas as demandas existentes, que envolvem, atualmente, 800 ocorrências policiais por dia, foi uma das grandes problemáticas tratadas. De acordo com o comandante do policiamento da Capital, coronel Mário Ikeda, o Disque Denúncia 190 recebe aproximadamente 5 mil ligações por dia. “Procuramos sempre atender a todos. Com a falta do efetivo necessário, tentamos fazer a prevenção, mesmo que as condições precárias de pessoal e de materiais que dispomos dificultem nossas operações. Trabalhamos agora com a repressão qualificada. Medimos a sensação de insegurança em cima dos indicadores de criminalidade. Tudo isso que tem acontecido é recorrente do tráfico de drogas, na medida que o consumo de drogas aumentou. Desde 2006, houve a despenalização do uso da droga. Ela não tem mais pena e deixará de ser crime”, ponderou o coronel Ikeda, afirmando que, nesta quinta-feira (05/05), será lançada uma nova fase da Operação Avante. “Neste ano, a Operação priorizará a atuação em áreas de vulnerabilidade social, buscando fazer a diminuição do indicador do homicídio. A ideia é trazer mais segurança ao centro de Porto Alegre para diminuir estes indicadores.”

Déficit no presídio

Já o diretor da Polícia Civil, delegado Cleber Ferreira, ressalta que, nos quatro primeiros meses de 2016, o número de prisões quase se igualou ao ano passado inteiro. “Nos últimos 15 dias foram realizadas 147 prisões na Região Metropolitana. Temos 180 mil ocorrências policiais por mês na Capital; destas, 127 mil ocorrências são criminais. O nosso maior problema é a falta de presídio. Tivemos, durante vários dias, 32 presos em uma cela que comporta somente quatro pessoas. Ficaram todos amontoados sem sol e sem comida. Situação de calamidade mesmo. A Brigada Militar chegava com os presos e precisava ficar dentro das suas viaturas com os detentos porque não podíamos autuá-los em flagrante e não tínhamos onde colocá-los”, comentou o delegado, ratificando que a área de maior incidência de crime contra o patrimônio fica localizada nos bairros Cavalhada, Vila Jardim, Ipiranga, Ipê, Restinga e Cruzeiro. 

Para o representante da Associação dos Juízes do Estado do RS (Ajuris), o diretor de serviços administrativos Eduardo Ernesto Lucas Almada, a questão prisional afeta os crimes nas ruas mais do que as pessoas imaginam. “Cada facção domina um determinado bairro da Capital. Hoje, temos casa prisional com infraestrutura pronta com 2400 vagas e que ainda não pode ser usada. Precisamos que as coisas aconteçam mais rápido. O Estado tem que tomar conta dos presídios e não os presos. Lá dentro eles fazem o que bem querem, tem sua própria lei e poder de mando. Temos que ingressar nos presídios e colocar o Estado lá dentro”, disse Almada.
 
Direito à segurança

O proponente da audiência pela Comissão de Constituição e Justiça, vereador Valter Nagelstein (PMDB), reiterou que “não há tema melhor para ser tratado", neste momento, do que a segurança pública. "Temos que reivindicar os impostos que pagamos e os direitos que temos. A formação do contrato social que permeia tudo. Temos direito à segurança pública. É preciso haver um trabalho de inteligência na aplicação dos recursos. Acredito na regulamentação do “bico” do policial e uma presença ostensiva do Estado, como ocorre nos países desenvolvidos, como os Estados Unidos”, garantiu Valter.

Direitos humanos

A representante da Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos, coronel Nádia Gerhard, observou que o direito das pessoas precisa ser tratado como prioridade. “Queremos iniciativa privada em funcionamento pleno e um estado que proporcione mais segurança. Agimos como se o direito dos outros não existisse. Falta repactuarmos tudo. Segurança do século XXI implica a coparticipação, que é o processo de cooperação social, onde um se dá na medida do outro. Segurança pública não se faz somente com a Polícia Civil e com a Brigada Militar, se faz conhecendo o local onde se trabalha e o local onde estão”, definiu.

Insegurança no comércio

O presidente do Sindicato dos Lojistas (Sindilojas), Paulo Kruse, provocou algumas reflexões. “É importante chegarmos a algumas soluções. É notório que é insuficiente o número de pessoas que estão aqui reivindicando mais segurança. O que falta no contexto é um sistema que não é de Porto Alegre e não é do Rio Grande do Sul, é do Brasil. Nossa população, independentemente de qualquer partido, precisa estar articulada e trabalhar em conjunto. O que nós temos que entender é que, como sociedade, temos que fazer o sistema funcionar, sem olhar os interesses próprios e pessoais de cada um”, afirmou.

Já conforme o representante da Associação Comercial de Porto Alegre (ACPA), Norton Luiz Lenhardt, é enorme a angustia que os empresários do comércio estão sentindo. “Eu saio hoje daqui muito mais preocupado do que entrei. É lamentável chegar ao ponto que chegamos. Os negócios estão fechando por causa da violência. Porto Alegre poderia sediar grandes eventos e congressos. Mas estamos todos com medo de sair nas ruas. O principal problema é a educação que está falida, e as consequências vão para o crime”, reconheceu Norton.

Vereadores

A vereadora Sofia Cavedon (PT) afirmou que é preciso haver um trabalho de convencimento das autoridades públicas. “A vida das pessoas está por um fio, está por um golpe de sorte. Uma das dimensões de minha fala é que o governo precisa ter clareza. Tivemos uma redução de 10% no contingente de policiais em locais públicos e em escolas públicas da Capital”, comentou.

Para o vereador Delegado Cleiton (PDT), é urgente que se começar a debater a segurança pública. “Precisamos ter um plano de estado para a segurança e não somente um plano de governo. Precisamos dar seguimento e continuidade aos projetos de segurança. O Denarc, o Deic e a Brigada Militar estão prendendo muito, mas não adianta só prender. Temos pouco investimento em educação e saúde. Tudo isso é fazer segurança. O papel não é somente da Brigada militar e da Polícia Civil. A responsabilidade é também dos governos, que precisam ter uma gestão organizada que se preocupe com a população, investindo em saúde e educação. Precisamos ter respeito dos governantes. É muito importante essa integração das comunidades para controlar o faroeste que está se tornando Porto Alegre e o Rio Grande do Sul”, declarou.

O vereador Marcelo Sgarbosa (PT) fez comentários ao livro da autora Jane Jacobs, “Morte e Vida de Grandes Cidades”. “Eu trabalhei em instituições e ONGs ligadas à segurança pública. Precisamos questionar uma cidade rodoviarizada para gerar insegurança. O livro ressalta esse posicionamento. Grandes avenidas e grandes rodovias não ajudam na integração das comunidades. Quanto mais larga as calçadas, mais os vizinhos se conhecem e quanto menor, menos se conhecem. A prioridade da nossa cidade é o deslocamento mais rápido possível. Vamos pensar na cidade como um lugar de convivência e encontros”, ponderou Marcelo Sgarbossa.

Participação social

Segundo a representante do Conselho Distrital de Saúde da região Glória, Cruzeiro e Cristal, Jussara Cabeda, 30 famílias foram desalojadas por causa dos traficantes. “Estamos caminhando por dentro das vilas, e o traficante está vendendo drogas na porta. A nossa proposta é tentarmos promover a cultura da paz”, disse.

O representante do Conselho Comunitário de Justiça e Segurança do Bairro Petrópolis, Ricardo Ortolan, afirma que a comunidade está acuada e com medo. “Ocupamos a oitava posição como mais populoso bairro e o quarto bairro mais violento da cidade. Temos a primeira posição em furtos e roubos de carros. Estamos sendo atacados e mortos por indivíduos que vivem em prisão domiciliar. O direito de ir e vir não nos pertence mais. Hoje a criminalidade é geral na nossa cidade. Temos que morar em condomínios fechados com segurança privada que nos remetem à segurança da idade média. Não podemos mais conviver em comunidade. É fundamental haver a prevenção do crime com policiamento nas ruas”, reivindicou Ricardo.

Conforme o diretor do Conselho Municipal de Justiça e Segurança de Porto Alegre, José Antônio Bruno Knob, a necessidade maior é a atenção por parte dos governantes. “Ao longo dos anos 1980 e 1990 certos temas não foram valorizados. As 17 regiões da Capital têm seus fóruns constituídos. Não temos tido a devida atenção dos órgãos públicos. O Conselho tem como objetivo promover o controle social. Sabemos que o tema da violência e segurança foi pensado pela Polícia e pela Justiça. É preciso fortalecer o sistema municipal de proteção social e haver uma melhor ação estratégica das polícias para fazer o recolhimento de armas”, afirmou.

O vice-presidente da Associação Amigos do Bairro Bom Fim, jornalista Milton Gerson, destaca que a estratégia que está sendo adotada está equivocada. “Se a segurança pública está errando em prevenção, está errando também em ação. Perdemos o posto policial do Bom Fim, na Redenção, e lá sabíamos que um policial estava há 29 anos. Saúdo a Brigada Militar, que tem sido uma guerreira, trabalhando com muito sacrifício pessoal. Mas entendemos que há um distanciamento da comunidade. Falta diálogo e integração. Outros postos policiais estão fechando na cidade. Há postos policiais que são estratégicos geograficamente. Não podemos perdê-los”, defendeu Milton Gerson.

O mesmo questionamento fez a representante da Associação do Bairro Cidade Baixa, Ana Lúcia Touguinha Weidle. “Reformamos todo o posto policial da rua Fernando Machado e agora fecharam suas dependências e vão colocar uma dependência da Defesa Civil. É um absurdo”, reclamou.

Encaminhamentos

Ao responder aos questionamentos de alguns líderes comunitários em relação ao fechamento dos postos policiais em pontos estratégicos da cidade, o comandante do policiamento da Capital, coronel Ikeda, declarou que efetivamente foram fechados alguns postos. “Isso não quer dizer que atenderemos pior a comunidade. Os postos que fechamos, o fizemos para atender o maior número de pessoas. Sabemos que a comunidade discorda, mas os mesmos foram fechados buscando atender melhor e fazer uma prevenção adequada e a não desassistir a comunidade”, esclareceu.

O presidente da Câmara, Cassio Trogildo, encerrou o encontro garantindo que o parlamento municipal estará sempre disposto e engajado para ajudar o poder público e as entidades representativas a buscar soluções. “Passamos, nesta noite, por muito debate e integração. A Câmara pode ser a mediadora e ajudar no fomento deste Comitê gestor da segurança na cidade. Queremos que o município assuma mais responsabilidades. Segurança pública é o conjunto das ações constituídas em todas as esferas. Seja na escola, na creche funcionando, ou no presídio. Os policiais têm muita responsabilidade. Estamos aqui não para achar culpados, mas sim para achar soluções. A segurança efetiva começa com boa educação e saúde de qualidade para os nossos cidadãos”, finalizou o presidente.

Também participaram do encontro o vice-presidente financeiro da Fecomércio, André Roncatto, e o vereador Reginaldo Pujol (DEM).


Texto: Mariana Kruse (reg. prof. 12088) 
Edição: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)