Cosmam discute impacto da Resolução 487 do CNJ em Porto Alegre
A Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) discutiu o impacto da Resolução 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que institui a Política Antimanicomial do Poder Judiciário, em reunião realizada na manhã desta terça-feira (15/08). O presidente da Comissão, vereador José Freitas (Republicanos), abriu os trabalhos e, de imediato, passou a palavra para a proponente da pauta, vereadora Psicóloga Tanise Sabino (PTB). Ela contextualizou que a política antimanicomial prevista pela Resolução determina o fechamento de hospitais de custódia, onde estão pessoas que cometeram crimes, mas que apresentam transtornos mentais, como em Porto Alegre, o Instituto Psiquiátrico Forense (IPF).
Conforme a vereadora, dados da Prefeitura dão conta de mais de 2 mil pessoas esperando para serem atendidas nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs). “Na minha visão, o município não teria condições de absorver mais essa demanda. Esses pacientes têm alta periculosidade. Primeiro temos que fortalecer a rede, para depois ter estrutura para abarcar esses pacientes. Corremos o risco de eles não serem atendidos nos CAPs e pararem na cadeia”, apontou Tanise.
A coordenadora da Saúde Mental do Município, Cristiane Stracke, mostrou-se preocupada com a Resolução 487. “Seis meses da publicação da Resolução, e a nossa rede de saúde mental do SUS de Porto Alegre já é insuficiente para tratar pessoas que não cometeram nenhum delito”, alertou. Ela ponderou que não é tão simples criar serviços, porque isso demanda custos para o município e que, às vezes, simplesmente não tem o recurso. “Em fevereiro do ano que vem, o IPF terá que fechar as portas, será que todo mundo já terá se encaminhado lá dentro? Porto Alegre não pode pagar essa conta por todo mundo que está no IPF. Muitos cometeram crimes dentro da família e a família passou a rechaçar”, afirmou Cristiane.
Representando a Associação de Psiquiatria do RS, o psiquiatra do IPF, Pedro Zoratto, avaliou que a Resolução é completamente ideológica e que desconsidera a singularidade de aquela pessoa com transtorno mental ter cometido um delito. “A resolução não traz a importância da psiquiatria forense, que faz a interface da psiquiatria com o Direito”, observou. Ele salientou que quem está no IPF precisa de um tratamento individualizado, visando à ressocialização, e a grande dificuldade é o acesso à rede psicossocial, que em muitas cidades do Estado nem sequer tem CAPs. O psiquiatra disse ainda que não tem como o IPF fechar, pois ele propõe uma internação de longa permanência, mas que a pessoa possa retornar ao convívio se possível.
A coordenadora de saúde mental da Susepe, Paula Carvalho, contou que desde o dia 8 de junho ninguém mais entra no IPF, porque ele está interditado. “Com a Resolução, a gente foca que a lei diz, que ele tem que fechar”, resumiu. Segundo Paula, 195 pessoas hoje cumprem medida no IPF e 26 são de Porto Alegre, as demais são de outros municípios. “Alguns casos do IPF vão demorar muito tempo pra sair de lá, alguns casos em um ano não vão ser concluídos e a gente tem que ter responsabilidade com a sociedade e com as pessoas que estão lá; mesmo com tudo isso, tem uma legislação e a gente tá buscando que ela seja cumprida”, explicou.
O diretor do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Rogério Cardoso, apontou que essa é uma discussão muito antiga no Brasil; em 1921, foi criado, no Rio de Janeiro, o primeiro hospital de custódia e tratamento. “A partir dessa Resolução, não tem mais custódia, talvez tenha hospital”, declarou. Ele falou das principais funções do IPF, tais como a perícia, que determina se a pessoa será apenada ou se ficará internada; a atuação no tratamento e nas pesquisas na área. “Nós estamos fechando um Instituto que tem uma efetividade de 70% para botar esses doentes mentais dentro de um sistema que reabilita 30%. O nome disso pra mim é burrice”, criticou.
Para a defensora pública dirigente do Núcleo de Defesa da Saúde da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (NUDS – DPE/RS), Liliane Dable, a Resolução peca por faltar técnica psiquiátrica e um estudo aprofundado. “A Defensoria opera com isso, esse debate tinha que ser anterior, buscando uma solução”, afirmou. A procuradora municipal de Porto Alegre, Caroline Lengler, apontou que os serviços são cada vez mais municipalizados, mas que não há verbas correspondentes para a execução. Ela contou que Porto Alegre tem que absorver demandas de saúde de usuários de outros municípios, inclusive.
Nos encaminhamentos da reunião, a proponente apontou que a questão da Resolução 487 pode ser uma oportunidade de incremento da rede municipal de saúde. “O que me preocupa é o papel de Porto Alegre. Vai acabar sobrando pra nós, como se diz, em uma rede que já está saturada”, ponderou. O presidente da Cosmam encerrou dizendo que “não podemos permitir que essa Resolução prospere”.