População que vive nas ruas foi ouvida na Câmara
As queixas e pedidos foram muitos. Ao final, 10 reinvindicações foram aprovadas, todas voltadas as garantias de vida dos envolvidos
Após três horas e meia de reunião da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) da Câmara Municipal de Porto Alegre, na terça-feira (dia 13/06/2023), foram aprovadas 10 propostas que serão encaminhadas ao Executivo Municipal e também instituições federais na área da saúde e segurança alimentar. A reunião, proposta pelo vereador Pedro Ruas (PSOL), ouviu as queixas e reivindicações feitas por lideranças do Movimento População Povo de Rua, e aprovou os seguintes encaminhamentos:
Solicitar a realização de um censo dos moradores de rua que tenha acompanhamento com a Pastoral do Povo de ruas e as instituições que trabalham com moradores de rua; Pedir a reabertura plena (com todas as secretarias) do Comitê do Povo de Rua que foi fechado em decorrência da covid/19 e nunca mais reabriu; Respeito às organizações oriundas dos próprios moradores se rua e às que os apoiam, como ongs, sociedade civil organizada; Implantação de uma política habitacional com vistas a essa população; Acolhimento na área da saúde, sem burocratização que por vezes compromete o atendimento; Fim da truculência que tem sido praticada por alguns integrantes da Guarda Municipal; Exigir a implantação das câmeras nos uniformes da guarda municipal, como forma de resguardar as duas partes – morador de rua e guarda; Interromper as remoções de moradores de ruas durante o inverno; Mudança no modelo de atendimento nos abrigos, incluindo locais para guardar alguns pertences, alguns com áreas onde possam ser abrigados os cães e a adoção de horário menos rígido e a Transparência na política de ocupação das anunciadas vagas.
Direitos Essenciais Desrespeitados
Alimentação, segurança, saúde, moradia e respeito são quesitos básicos que fazem falta aos que vivem em situação de rua, na Capital gaúcha. Na reunião realizada pela Cedecondh, os problemas dessa população foram debatidos, contando com a presença dos próprios moradores em situação de rua, que fizeram seus relatos, autoridades e diversas ongs e representantes de universidades UFRGS, PUC, Unisinos. A reunião durou quase quatro horas, contou com as presenças de representantes de diversas instituições e entidades, entre essas Luciana Dal Sassio/OAB/RS, Marcelo do Nascimento, comandante da guarda municipal, Edson Campos(beiço), do Movimento Nacional dos Povos da Rua; Vania Maria Franz, Secretaria Municipal de Saúde; Elton Bozzetto da Pastoral dos Povos de Ruas ; Carla Justina Engels, juíza federal; Jair Krischke , presidente Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Cicero Adão Gomes (Povo de Rua), diversas ong, entre as quais a ALICE, Passa e Repassa, Quem Tem Fome tem Pressa e várias outras. A comissão é presidida pelo vereador Conselheiro Marcelo (PSDB), que deu a condução dos trabalhos ao vereador Pedro Ruas, mas participou de toda a reunião, inclusive com sugestões, da mesma forma que o Professor Alex Fraga (PSOL).
Na abertura dos trabalhos Pedro Ruas lembrou que ele e Jair Krischke, no inverno do ano de 1993 percorriam as ruas de Porto Alegre vendo a situação dos moradores de rua e a sua tragédia, buscando espaços em abrigos ou fornecendo agasalho. "Fazem 20 anos que já apontávamos os problemas que só aumentaram, não foram resolvidos até agora. Precisamos de uma política adequada e por isso chamamos todas as partes para podermos buscar soluções", disse o vereador.
O representante do Movimento População Povo de Rua, Cícero Adão Gomes, fez uma explanação sobre a situação pela qual passa a população de rua de Porto Alegre, e afirmou que com a chegada do inverno os problemas aumentam. Agradeceu aos vereadores a possibilidade de ficarem frente a frente com as autoridades e chorou ao lembrar companheiros que morreram na luta, na caminhada. "Nossa luta é por ter os direitos mais básicos. Vamos seguir lutando por nós e pelos que faleceram, vários que lutaram e morreram na rua”, afirmou. Já o coordenador da Pastoral do Povo de Rua, que congrega vários coletivos, Elton Bozzetto, foi muito claro ao dizer que a luta principal para atender as necessidades dos que moram nas ruas, é uma mudança de comportamento. " Essas pessoas são gente como nós. É indigno que sejam tratadas sem os direitos básicos a que deveriam usufruir como cidadãos". Presente ao evento, o comandante da Guarda Municipal de Porto Alegre, Marcelo do Nascimento, disse não tinha conhecimento de abordagens truculentas por parte do seu efetivo. Ele garantiu que qualquer denúncia que seja feita para a corregedoria será apurada. “Nós temos uma corregedoria muito atuante”, apontou. Marcelo garantiu que a guarda municipal está em constante aperfeiçoamento e pediu apoio dos movimentos e sociedade civil para fiscalizar e garantir segurança e bom atendimento à população de rua.
Jair Krischke lamentou e se disse "decepcionado" com a falta de comprometimento do prefeito. "Não esperávamos esse descaso do prefeito. Lembro sim, de quando Pedro Ruas e eu andávamos pelas ruas dando apoio. Buscamos e conseguimos ajuda do então governador Alceu Colares e do prefeito Tarso Genro. Mas hoje a situação é muito triste, não encontramos boa vontade do poder público e isso me desgosta. Tenho medo de morrer e não ver o fim dessa verdadeira tragédia de injustiça com seres humanos que sofrem para ter seus direitos respeitados", declarou o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, muito emocionado com os relatos. A advogada Luciana Dal Sassio/OAB/RS, esclareceu sobre os direitos. “Qualquer cidadão, mesmo que não tenha moradia, tem direitos e deve exercê-los”, enfatizou a profissional que atua na área dos direitos humanos.
Sobre a saúde, a diretora geral da Atenção Primária em Saúde, Vânia Franz, garantiu que a pasta está em constante monitoramento dos moradores de rua. E que as dificuldades de acolhimento e abordagem são fruto do aumento da população de rua e da forma de prestação de serviço e atendimento. Ela garantiu que apesar da fragilidade, tem se tentado trabalhar de forma integrada para ampliar o atendimento. “A gente está sensível a essa situação”, afirmou.
A representante da Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC), Patrícia Mônico, falou que apesar das dificuldades evidentes, a Fundação tem garantido vagas em albergues. Segundo ela, muitos locais possuem vagas que não são ocupadas. A informação foi contestada por vários representantes de entidades parceiras. Além disso, se questionou o modelo de abrigamento ofertado que não dispõe de espaço para a guarda de pertences (carrinheiros temem perder sua única fonte de renda, cobertores, agasalhos), não tem um local para os cães e precisam levantar 5h da manhã.