Cuthab

Prejuízo da bilhetagem eletrônica e privatização da Carris pautam reunião

  • Cuthab debate situação da Carris no transporte de Porto Alegre. Com a fala Marcelo Webber, representante dos trabalhadores da Carris.
    Marcelo Weber criticou controle do transporte público por empresa privada e proposta de privatização da Carris (Foto: Jeannifer Machado/CMPA)
  • Cuthab debate situação da Carris no transporte de Porto Alegre. Com a fala o secretário adjunto de mobilidade urbana Matheus Ayres.
    Matheus Ayres disse que relatório final do GT sobre a Carris será apresentado á Cuthab nas próximas semanas (Foto: Jeannifer Machado/CMPA)

A situação da Empresa Pública Carris no contexto do transporte público da Capital foi debatida pela Comissão de Urbanização, Transportes e Habitação (Cuthab) da Câmara Municipal de Porto Alegre nesta terça-feira (15/6). A reunião virtual foi coordenada pela vereadora Karen Santos (PSOL), vice-presidente da Cuthab e proponente da pauta.

André Augustin, representante do Observatório das Metrópoles, apresentou uma série de fatores que prejudicam a situação financeira da Carris, inclusive dados de uma auditoria específica sobre a bilhetagem eletrônica. “O sistema, que deveria ser controlado pela prefeitura, é gerido pelas empresas privadas e é repassado menos dinheiro do que a Carris deveria receber, numa apropriação indébita de recursos públicos”, afirmou, referindo-se à bilhetagem, que é controlada pela Associação dos Transportadores de Passageiros de Porto Alegre (ATP). 

Ele destacou que, conforme a licitação do transporte coletivo, realizada em 2015, tanto a receita oriunda da comercialização de espaços publicitários quanto os rendimentos da aplicação financeira advindos da comercialização de créditos antecipados, entre outras receitas extraordinárias, deveriam ser geridos pelo Executivo e utilizados para subsidiar o valor da tarifa. No entanto, frisou, a ATP segue gerindo a bilhetagem e declarou, em 2020, rendimento de R$ 318,4 mil, sendo que o saldo de créditos a serem entregues (passagens antecipadas ainda não utilizadas) era superior a R$ 160 milhões. Aplicado pela taxa Selic, este saldo renderia cerca de R$ 5 milhões, valor muito superior ao declarado. 

Conforme Augustin, o Executivo concedeu um “subsídio disfarçado” às empresas privadas quando as mesmas adotaram tabela de verão e deixaram de fazer determinadas linhas - inclusive sem avisar a EPTC, o que já seria motivo para rompimento do contrato. “A Carris assumiu todas essas linhas. Não temos um sistema onde as empresas privadas são mais eficientes, mas um sistema controlado pelas privadas e que prejudica a Carris”, afirmou.

Trabalhadores

Para Marcelo Weber, representante dos trabalhadores da Carris, os dados apresentados por Augustin comprovam que é possível melhorar o transporte de Porto Alegre. “Por que o controle do transporte público é feito por uma empresa privada?”, questionou. Ele apelou aos vereadores que analisem com cuidado o tema e não aprovem a proposta de privatização da empresa. “Se as (empresas) privadas não querem, vamos repactuar o sistema de transporte para ampliar a atuação da Carris”, defendeu.

Sandro Abbáde, presidente do Sindicato dos Rodoviários de Porto Alegre, disse que a entidade atuará firmemente contra a privatização. Segundo ele, os trabalhadores da Carris estão abalados emocionalmente com a insegurança quanto ao futuro profissional. “Quando o prefeito fala da privatização, não fala o que será feito com os funcionários”, enfatizou. Para Abbáde, o que precisa ser feito é dar tempo para que a atual diretoria da Carris mostre resultados e não se chegue à privatização.

Desequilíbrio

Flávio Tumelero, gerente da EPTC, contrapôs alguns pontos da apresentação de André Augustin. Ele citou que houve redução drástica de passageiros no início da pandemia, situação que ainda não se normalizou. “Ficamos com 20% de passageiros circulando, então houve necessidade de ajuste. A Carris reduziu menos que outras empresas”, afirmou, explicando que as empresas privadas afastaram funcionários amparadas em medida provisória do governo Federal, ao passo que a Carris, por ser pública, não se enquadrava no critério da legislação. “Como tinha recurso humano de sobra, passou a atender linhas”, acrescentou. Tumelero destacou que foram realizados dois acordos, um em 2020 e outro em 2021, com o intuito de reduzir o desequilíbrio causado pela queda de passageiros, “principalmente com as empresas privadas, onde, pelo contrato de concessão, isso causa uma série de problemas”, referindo-se à possibilidade de indenização dos contratos.

“Este é um assunto difícil, mas temos aqui a responsabilidade de tratar da coisa pública e tomar as melhores decisões para todos, para a cidade”, afirmou Matheus Ayres, secretário-adjunto de Mobilidade Urbana. Ele disse que tem participado dos encontros do grupo de trabalho sobre a Carris e que, “na parte técnica, a conta não fecha”. Destacou que, por ter um custo de operação maior, a companhia precisa de aportes financeiros mês a mês. Conforme Ayres, está se encerrando o trabalho do grupo e o relatório final das possibilidades será apresentado na Cuthab nas próximas semanas.

Já Maurício Gomes da Cunha, diretor-presidente da Carris, explicou que “as 19 linhas que a Carris assumiu não trazem prejuízo para a empresa, pelo contrário”. Segundo o gestor, as linhas, que serão devolvidas nesta quarta-feira (16/6), garantiram uma receita extraordinária de R$ 25 milhões. “Mesmo com o afastamento de quase 400 funcionários, tínhamos pessoal sobrando”, destacou, acrescentando que 70% do custo da operação é relativo a pessoal e frota, o que a Carris já possuía. Conforme ele, a partir deste mês, sem as 19 linhas, a companhia voltará a precisar de aporte financeiro por parte da prefeitura.

Vereadores

Para Roberto Robaina (PSOL), “é preciso ter uma empresa pública forte e não o contrário, se não vamos estar totalmente nas mãos das empresas privadas”.  Segundo o parlamentar, há duas “disfuncionalidades gravíssimas” que prejudicam a Carris: má gestão e corrupção na empresa e nos governos e um sistema sustentado pela tarifa. “Diminuindo a quantidade de passageiros, sobe a tarifa e o mais prejudicado é o povo pobre”, destacou. Ele ainda abordou projeto de lei de sua autoria, baseado na proposta apresentada pelo governo Marchezan, que cria um taxa de mobilidade urbana para que a tarifa seja sustentada pelo conjunto da sociedade, sobretudo dos setores empresariais.

Aldacir Oliboni (PT) lamentou a posição do atual governo, quando informa a intenção de desestatização da Carris, “dizendo que o modelo atual faliu e que o cidadão não pode ser penalizado com um serviço ruim e caro”. “Melo falou na campanha, por diversas ocasiões, que não iria privatizar a Carris. Dizia que iria discutir com os trabalhadores e com a sociedade o que era possível fazer”, pontuou, acrescentando que o “prefeito não está interessado no cidadão e na cidadã”. 

Para Karen Santos, as informações trazidas por Augustin são gravíssimas e não podem ser tratadas pelo Executivo como algo normal. Como encaminhamentos da reunião, aprovados pelos presentes, ela sugeriu que a Comissão leve ao Comtu a proposta de adiamento da votação de aumento da passagem, tendo em vista as informações apresentadas pelo Observatório das Metrópoles; e a realização de nova reunião para apresentação do relatório que está sendo finalizado pela prefeitura com relação à auditoria da bilhetagem eletrônica. Ainda participaram do encontro os vereadores Hamilton Sossmeier (PTB) e Pablo Melo (MDB).

Texto

Ana Luiza Godoy (reg. prof. 14341)

Edição

Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)

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