AUDIÊNCIA PÚBLICA

Recupera POA foi debatido pela Câmara

  • Audiência pública para debater sobre o Programa de Recuperação Fiscal (Recupera POA).
    Audiência pública para debater sobre o Programa de Recuperação Fiscal (Recupera POA). (Foto: Jeannifer Machado/CMPA)
  • Audiência pública para debater sobre o Programa de Recuperação Fiscal (Recupera POA). Na foto, presidente da Câmara vereador Marcio Bins Ely.
    Bins Ely coordenou a audiência (Foto: Jeannifer Machado/CMPA)

A Câmara Municipal de Porto Alegre realizou audiência pública nesta quinta-feira (24/6) para debater sobre o Projeto de Lei Complementar do Executivo (PLCE) nº 004/2021, que institui o Programa de Recuperação Fiscal - Recupera POA. A reunião ocorreu por solicitação da Associação dos Técnicos de Nível Superior do Município de Porto Alegre (Astec) e da Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), sendo coordenada pelo presidente do Legislativo, vereador Márcio Bins Ely (PDT).

O Programa

O secretário municipal da Fazenda, Rodrigo Fantinel, apresentou o objetivo do programa, que é proporcionar aos empreendedores da cidade condições de pagar seus tributos e regularizar sua situação, “dadas as condições impostas pela pandemia”. “A ideia é que a gente dê condições para que as empresas consigam se manter neste período de pandemia”, enfatizou. Fantinel acrescentou que o último programa de parcelamento do Município foi restrito ao ISSQN e o último refis de IPTU foi realizado há 15 anos. 

“É importante ressaltar que não estamos abrindo mão de qualquer centavo de tributo. Os descontos são apenas nos juros e na multa”, disse, destacando que, mesmo com o desconto na oneração, o inadimplente não terá as mesmas condições de quem pagou à vista. “Nossa expectativa é de negociar próximo a R$ 110 milhões, um montante significativo para o município”, afirmou. 

Na sequência, o superintendente da Receita Municipal, Christian Justin, apresentou os detalhes técnicos do Recupera POA, destacando que os valores inscritos em Dívida Ativa do Município aumentaram para R$ 2,31 bilhões com a pandemia.  O projeto em debate na audiência pública inclui a negociação de ISSQN, IPTU, ITBI, Taxa de Coleta de Lixo (TCL) e Taxa de Fiscalização de Localização e Funcionamento (TFLF), inscritos ou não em dívida ativa, além de créditos não tributários inscritos na dívida ativa. Entre as principais regras, estão a ausência de desconto sobre o valor principal dos débitos (apenas em juros e multas), e, no caso de parcelamento de créditos anteriormente parcelados e revogados por inadimplência, a obrigatoriedade do pagamento de pelo menos 5% do valor na primeira parcela. O programa aplica-se aos créditos não tributários inscritos em Dívida Ativa até 30 de abril de 2021 e aos créditos tributários com fatos geradores ou notificados até a mesma data, mesmo em fase de execução fiscal ou que tenham sido objeto de parcelamento anterior, ainda que cancelado por falta de pagamento.

O juiz Alex Gonzales Custodio, representando a Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (AJURIS), enalteceu a qualidade do trabalho dos fiscais da Fazenda. Também celebrou o projeto em questão ao considerar que não existe regramento sobre parcelamento de crédito fiscal. Reforçou que o projeto necessita de algumas alterações para que não seja necessário fazer nova cobrança após o parcelamento. Sugeriu um valor de entrada maior e prazos fixos e específicos para os demais pagamentos, além de uma garantia idônea do credor. O juiz entende que é preciso avaliar a capacidade de cada um dos devedores, exemplifica com a cobrança a um grande banco e a um morador de bairro mais pobre. Também sugere que o credor, ao fazer o parcelamento, assine confissão com assinatura de um auditor fiscal, que possui fé pública. 

 

O presidente da Associação dos Técnicos Nível Superior do Município de Porto Alegre (Astec) Irineu Pedro Foschiera considerou que o projeto não pode desestimular o bom pagador e incentivar a inadimplência. Pediu que devedores contumazes não sejam contemplados, assim como outros infratores que não respeitam a legislação ambiental e cometam outros ilícitos. Para ele, o projeto deve auxiliar quem necessita, como promoção de justiça social. 

 

Já o vice-presidente da Astec, Sergio Brum, lamentou a aprovação da reforma da previdência em primeiro turno como forma de reaver R$3 milhões mensais "do bolso dos servidores". Considerou que o projeto busca recuperar R$110 milhões de débitos que somam R$2,3 bilhões. Para ele, desta forma, o desconto de até 90% de dívidas é um benefício aos sonegadores de impostos. Também reforçou que não se pode tratar devedores desiguais da mesma maneira.

 

Vereadores

Airto Ferronato (PSB) citou que há pessoas físicas e jurídicas que não pagaram seus tributos por “total incapacidade financeira”, enquanto outros são devedores contumazes que se aproveitam dos programas de financiamento da dívida. Para ele, é preciso diferenciar os devedores.

Karen Santos (PSOL) considerou o projeto pertinente para o momento em que se vive uma crise financeira agravada pela pandemia e que é relevante debater estas receitas que garantem os direitos básicos à população, como transporte, alimentação e renda básica. Karen afirmou que o projeto, como está posto hoje, beneficia apenas alguns setores da economia, visto que os mais impactados pela crise não conseguirão fazer a renegociação de suas dívidas. Sugeriu que não sejam contemplados aqueles que respondem processos de crime de ódio e de preconceito, assim como quem foi multado por descumprir medidas sanitárias impostas pela pandemia da Covid-19. Segundo ela, para garantir equidade e justiça social, é preciso estabelecer um ponto de corte entre os devedores, evitando privilégio de setores já privilegiados.

Para Aldacir Oliboni (PT), o Executivo não pode tratar de forma igual o cidadão que deve o IPTU de sua moradia e o empresário com dívida de R$ 1 milhão. Ele sugeriu que o governo reavalie a proposta e envie uma mensagem retificativa a tempo de evitar excesso de emendas. O parlamentar acrescentou que o prefeito anterior, além de aumentar o IPTU, aumentou o valor venal dos imóveis, gerando uma “enormidade de inadimplentes”. 

A crise gerada pela pandemia também foi mencionada pela vereadora Reginete Bispo (PT), que, segundo ela, gerou uma transferência de renda dos mais pobres aos mais ricos. Reginete disse que é necessário separar pessoas físicas de jurídicas e estabelecer quem serão os beneficiados. Também reforçou o valor dos débitos de R$2,3 bilhões com expectativa de recuperação de R$110 milhões, que contrapõe o esforço do governo em aprovar a Reforma da Previdência. Finalizou dizendo que o projeto precisa focar nos pequenos e micro empreendedores, assim como nas pessoas físicas.

Moisés Barboza (PSDB) defendeu a importância de critérios socioeconômicos para o Município ser mais justo. Citou exemplo dos filhos, que são estudantes, mas não precisam utilizar a gratuidade da passagem por terem uma renda que permite o pagamento do transporte. O parlamentar pediu que se avance na construção do projeto “no sentido da equidade”.

Cláudio Janta (SD) considerou a importância do projeto de renegociação aos credores. Relembrou que a crise gerada pela pandemia fez com que muitos empresários ficaram com atividades comprometidas e muitas ainda nem retomaram o trabalho. Segundo Janta, é papel da cidade e da Câmara buscar auxiliar estas pessoas que passaram por grandes dificuldades, mas que alguns segmentos precisam de tratamento diferenciado, como o segmento bancário e o de transporte. Para ele, a renegociação das dívidas é importante para manter quem gera empregos na cidade, fazendo com que recursos que não estão entrando no município passem a entrar.

Entidades

Avaliando que a situação de recuperação fiscal da Fazenda Nacional não deve ser muito diferente da situação dos estados e municípios, Daniel Menezes, procurador da Fazenda Nacional e membro da Comissão de Justiça da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe), afirmou que uma minoria acumula a maior parte das dívidas. Destacou que 7,8% das empresas possuem débitos e, desses, apenas 0,6% acumulam 70% dos débitos com a Fazenda Nacional. Para ele, é urgente adotar mecanismos de parcelamento que tratem as pessoas de acordo com seus perfis para não correr o risco de causar desequilíbrio. 

Richard Alves, representante da Associação Satélite Prontidão, lembrou que as organizações sociais já vinham com receita reduzida mesmo antes da pandemia, em virtude da crise financeira do país. “A minha associação, assim como outras que também são sem fins lucrativos, se encontram em situação de inadimplência com os compromissos fiscais”, citou, pedindo que as emendas ao projeto garantam uma forma mais justa de atender às necessidades dessas entidades. 

Considerações finais

Alex Custódio, da Ajuris, entende que é preciso mudar a cultura e a educação dos brasileiros em relação aos impostos, segundo ele, o cidadão não tem medo de deixar de pagar seus impostos. Afirmou que na matéria fiscal não existe assistencialismo e que todos são iguais na obrigação de pagar impostos. Para Custódio, o projeto é uma oportunidade de construir a lei com equidade, proporcionalidade e razoabilidade. 

O presidente da Astec considerou importantes as sugestões feitas durante a audiência pública, como não contemplar quem descumpriu regras de combate à pandemia. Para ele, o foco do projeto deve ser em gerar emprego, renda e justiça social.

Construção

No encerramento, o secretário da Fazenda disse que a equipe ouviu e anotou bastante, e que é possível progredir com as contribuições apresentadas no debate. Sobre o exame de perfil da dívida, disse que a prática já existe em Porto Alegre desde 2016 e que é responsável pelos bons resultados na recuperação fiscal. “Acho que o projeto pode ser melhorado, estamos dispostos a fazer esta discussão”, finalizou. Também acompanharam a audiência pública os vereadores Jonas Reis e Leonel Radde, da bancada do PT.

Texto

Ana Luiza Godoy (reg. prof. 14341)
Liziane Cordeiro (reg. prof. 14176)

Edição

Marco Aurélio Marocco (Reg. Prof. 6062)