Cedecodh

Servidores apontam desmonte do atendimento em saúde mental no Pacs

Saúde mental no PACS.
Reunião online da comissão foi realizada nesta terça-feira (Foto: Ederson Nunes/CMPA)

O aumento de demanda e a falta de estrutura para o atendimento à saúde mental em Porto Alegre, especialmente no Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul (Pacs), foi tema de reunião da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Pública (Cedecondh) da Câmara Municipal na tarde desta terça-feira (9/11). O encontro, por videoconferência, foi presidido pela vereadora Laura Sito (PT), proponente da pauta, e contou com a presença de vereadores, servidores do Pacs, representações de entidades de classe, associações e universidades. A ausência da secretaria municipal da saúde (SMS) foi cobrada pela parlamentar.

A falta de uma política de investimentos em recursos humanos e materiais para garantir uma rede de atendimento destinada a saúde mental foi a tônica das manifestações de servidores e representantes de conselhos de saúde e sindicatos. Não faltaram críticas ao que se definiu como uma aposta de investimento no sistema manicomial, voltado à ampliação de leitos psiquiátricos em hospitais e clínicas, como a São José, o que difere das resoluções tiradas por fóruns, congressos e outros espaços de debate do setor psicossocial.

Conforme Maria Alzira Grassi que atua no plantão de emergência em Saúde Mental do Pacs desde a sua inauguração, há 21 anos, desde 2015 é crescente o aumento de atendimento de crianças e adolescentes no local, fato que, explicou ela, se agravou ainda mais com a pandemia. Ela defendeu que esses pacientes tenham um local apropriado e que já existe uma solicitação para que sejam abertos mais centros de atendimento psicossociais infantis (Capsi) e o atendimento de emergência no Hospital Presidente Vargas. Mas reforçou que é preciso maior investimento como um todo na rede de atendimento básico e integração em rede.

Marcelo Silveira, assistente social no Caps, também destacou a falta de estrutura. Disse que muitas vezes não há lençóis para cobrir as camas, faixas de contenção e que o atendimento na emergência para doenças mentais, que comportaria 14 leitos, chega em média a quase 30, sob os cuidados de duas técnicas de enfermagem e uma enfermeira, o que foi confirmado pelo representante do Conselho Regional de Enfermagem (Coren/RS), Uiasser Thomas, também presente na videoconferência.

Alberto Terres, representante da comissão dos trabalhadores do Pacs e coordenador da área de saúde no Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa), citou o adoecimento dos servidores diante do descaso e sucateamento do setor da saúde. Falou de casos de agressões, com a necessidade de intervenção dos seguranças e de dois suicídios de trabalhadores dentro do Pronto Atendimento, “tamanha a pressão”, justificou.  Ressaltou que em reunião na segunda-feira, com a presença do secretário da Saúde da capital, foi informado que o serviço de urgência para crianças e adolescentes será transferido para o HMPV. Para Terres, porém, as ações do Executivo estão voltadas ao sucateamento com objetivo na terceirização.

Tiana de Jesus, representante do Conselho Municipal de Saúde (CMS), reforçou o discurso de que há um desmonte planejado da atenção à saúde mental, que foi intensificado na gestão Marchezan, mas que prossegue na atual e que desrespeita as resoluções das conferências municipais e outros fóruns. Para Tiana, é preciso dar atendimento nos territórios, nos Caps, mas o que se vê está nessa contramão, no fechamento dos Núcleos de Assistência em Saúde da Família (Nasf), na violação de direitos humanos de crianças e adolescentes e também de adultos”, salientou.

Vera Pasini, da Residência em Saúde Mental Coletiva da UFrgs, conclamou os participantes a erguer o tom. Ela se disse impactada com os relatos de quem trabalha no Pacs e acreditar que a pandemia e seus efeitos tenham anestesiado a todos. Para ela, a rede é frágil e não dá conta da demanda, sendo necessário um investimento em rede com opções de tratamento que não sejam de uma política de aprisionamento das pessoas.  

Vereadores

A vereadora Mônica Leal (PP) declarou que momentos antes de ingressar na reunião entrou em contato com o secretário da Saúde, Mauro Sparta. Que o contrato com a clínica São José foi feito com a gestão anterior e está sendo revisto pela atual. Que o governo está reorganizando o setor e a urgência para crianças e adolescentes será transferida para o Hospital Presidente Vargas. Que todo o sistema de saúde ficou sobrecarregado com a pandemia, porque muitos atendimentos a outras patologias foram represados em casa. Ainda, que dos seis Caps, apenas três permaneceram em funcionamento nesse período e que demoras em transferências ocorrem também pelo fato de muitos pacientes terem outras comorbidades, o que gera a necessidade de uma maior estrutura de atendimento nos hospitais. Por fim, que foi informada de que já está na rua o edital para concurso público a fim de suprir parte das necessidades.

Laura Sito encaminhou os temas centrais que foram levantados no encontro: da intervenção nos investimentos por meio do debate junto a Lei Orçamentária para 2022, cujo projeto está em tramitação no Legislativo; de uma rápida resposta para a dificuldade de estruturação dos recursos humanos no Pacs, que necessita de mais psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e outros servidores que garantam o atendimento multidisciplinar de qualidade aos usuários do sistema; do enfrentamento ao desmonte da atenção básica em saúde; de combate à política manicomial de leitos para tratamento de dependentes de álcool e drogas, que não dão vazão ao sistema; da fiscalização do contrato com a clínica São José, não apenas em relação aos leitos, mas a outras denúncias sobre o serviço ofertado; às denúncias de violação aos direitos humanos e a pressão para que aconteçam reuniões entre as chefias e os servidores do Pacs, para melhorar o fluxo de funcionamento com reflexo na melhoria do atendimento à população.

A vereadora declarou que o debate sobre o tema não se encerra no âmbito do Legislativo e que a reunião foi mais um espaço para dar voz a quem atua diretamente no sistema de saúde mental do município. Participaram ainda da videoconferência outras representações de classe, alám dos vereadores Alexandre Bobadra (PSL), Alvoni Medina (Republicanos), Matheus Gomes (Psol) e Kaká D’Ávila (PSDB).

Texto

Milton Gerson (reg.prof. 6539)

Edição

Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)