Audiência Pública

Câmara e comunidade debatem projetos de alterações urbanísticas

Quatro propostas em tramitação no Legislativo propõem mudanças em várias regiões da Capital

  • Audiência Pública com o objetivo de debater cinco Projetos de Lei que dispõem sobre matéria urbanística. Na foto, o conselheiro regional pela moradia popular, Juliano Fripp na tribuna.
    O debate ocorreu na noite de quinta-feira no Plenário Otávio Rocha (Foto: Andielli Silveira/CMPA)
  • Audiência Pública com o objetivo de debater cinco Projetos de Lei que dispõem sobre matéria urbanística.
    Moradores de diversas regiões de Porto Alegre manifestaram opiniões (Foto: Andielli Silveira/CMPA)

A Câmara Municipal de Porto Alegre realizou, na noite desta quinta-feira (14/12), audiência pública para discutir quatro projetos que modificam regimes urbanísticos na cidade e tratam de Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS) e de Áreas Especiais de Interesse Institucional (AEII). O debate com a participação da sociedade foi sugerido em reunião da Comissão de Urbanização, Transportes e Habitação (Cuthab).

Uma das matérias debatidas é o Projeto de Lei Complementar do Executivo nº 17/16, que tramita na Casa desde o ano passado e institui a criação de 13 Aeis nas regiões Norte, Sul e Leste da Capital. A matéria resulta de um grupo de trabalho criado em 2016 pelo então vice-prefeito Sebastião Melo para encontrar uma forma de avançar na regularização fundiária nessas regiões, como alternativa a proposta semelhante vetada pela administração municipal no ano passado. Entre as comunidades envolvidas, estão as ocupações Campo Grande, Marcos Klassmann, Progresso e Império, que foram representadas por oradores que falaram pelas comunidades: Lúcio Marlo Teixeira, Lisiane Vida Alves, Ronaldo do Espírito Santo, Arduino Balduino, Vera Mesquita e Galdino Freitas.

Grupo Hospitalar Conceição

Os outros três projetos versam também sobre mudanças no regime urbanístico em áreas da Capital. O PLCE nº 10/17 altera os limites de Área Especial de Interesse Institucional, constantes do Anexo 1.1 da Lei Complementar n° 434 de 1º de dezembro de 1999, para permitir que o Grupo Hospitalar Conceição (GHC) possa ampliar suas instalações com a edificação de novos prédios. As alterações nas densidades brutas, regime de atividades, índices de aproveitamento, regime volumétrico, padrões para guarda de veículos e recuos para ajardinamento, segundo o Executivo, irão permitir que o hospital possa incorporar, em sua estrutura física, a implantação de novas tecnologias para o Serviço de Diagnóstico e Tratamento.

De acordo com Adriana Denise Acker, diretora Superintendente do GHC, a reorganização física do Complexo Hospitalar Conceição passa pela retirada de todas as áreas de diagnóstico, terapia, apoio técnico e logístico do espaço hoje existente, o que permitirá a adequação e a humanização das unidades de internação e apoio. No Hospital da Criança Conceição (HCC), pelas condições precárias do atual prédio, ela informou que está proposta a edificação de novo hospital, incorporando a maternidade do Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC). Ela ainda informou que os novos prédios a serem edificados são o Centro de Oncologia, o Centro de Diagnóstico e Terapia (prédios I e II), o Hospital Materno-Infantil, a Central de Apoio Técnico e Logístico e a Subestação 69KVA, esta com inauguração prevista já para janeiro de 2018. 

Bairro Cascata

Já o Projeto de Lei do Legislativo nº 48/17, de autoria do vereador Aldacir Oliboni (PT), transforma em Área Especial de Interesse Institucional para fins de cultura e lazer o chamado Campinho do Calixto, no Bairro Cascata. O espaço em questão está localizado nas proximidades do número 666 da Estrada dos Batillanas, na Zona Sul.

Em nome da comunidade, Silvio Arce destacou que, há muito tempo, o local doado pela família Calixto, um dos poucos existentes na região de grande concentração habitacional, é utilizado pelos moradores do Cascata em atividades organizadas em parceria com comerciantes e instituições. Falou, ainda, que o esporte comunitário é o maior destaque e que lá ocorrem, com frequência, campeonatos e torneios.

Arce lembrou que a Escolinha de Futebol Meninos Show e a comunidade Amigos do Campinho Calixto participam do Programa em Cada Campo uma Escolinha, da Secretaria Municipal de Esportes. Disse, também, que o espaço deve ser preservado para continuar garantindo a realização de atividades que atendem jovens em situação de vulnerabilidade. O projeto estabelece ainda que o Campinho do Calixto deverá ser urbanizado e mantido pelo Poder Público Municipal.

Em sua manifestação, o vereador Oliboni afirmou que esse projeto, juntamente com o que trata da alteração urbanística para a ampliação do Hospital Conceição, serão as suas prioridades. “Construímos essa audiência pública para que as comunidades estivessem de acordo, para que dissessem de fato o que desejam na região. Sobre o Campinho do Calixto, disse que não dá para comparar um projeto que trata de meio hectare com outros que avaliam empreendimentos comerciais em áreas de 40 hectares ou mais e terão o impacto, somados, de aproximadamente 4 mil novas unidades habitacionais em uma área hoje gravada como rural pelo Plano Diretor.

Bairro Restinga

Sobre o Projeto de Lei Complementar do Legislativo nº 41/17, de autoria do vereador Reginaldo Pujol (DEM), houve somente a manifestação da representante das empresas associadas que pretendem empreender na área, localizada nas proximidades do acesso do bairro Restinga pela Avenida Edgar Pires de Castro. A arquiteta Rosane Zottis disse que o que se busca é o ajuste no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental (PDDUA) dos limites entre as zonas urbana e rural, o que, na prática, segundo ela, já está consolidado pelo uso no entorno, onde diversos empreendimentos habitacionais ali se encontram ou já possuem projeto aprovado para a construção.

A arquiteta informou que a previsão é a de criação de 1,5 mil lotes para quem tem renda entre três e seis salários, individualizados em aproximadamente 600 metros quadrados cada. Declarou que laudos ambientais apontam não haver qualquer risco de dano ao patrimônio natural. “Trata-se de 85% de campo, 8% de maricazal e o restante de mato de eucalipto”, salientou. Ela ainda justificou que o projeto irá gerar a doação de áreas destinadas à instalação de equipamentos comunitários, na forma de praça, escola, posto de saúde e creche, ao Município, beneficiando não somente os moradores do loteamento, mas suprindo deficiências atuais da região nesse setor. 

O projeto ainda beneficia outros empreendedores, em área lindeira. Os representantes, arquitetos Fernando Dalpiva e Oscaer Escher explicaram que a área, que contém uma boa parte gravada para a preservação ambiental, também irá dotar a comunidade de novos equipamentos comunitários, com destinação para a construção de postos de saúde, creches e escolas. Dalpiva disse que o projeto recebeu pareceres favoráveis de todas as secretarias do Município por onde tramitou. Também referiu os investimentos em obras de mobilidade urbana no entorno, desde a pavimentação das estradas da Francisca e Edgar Pires de Castro, totalizando mais de 2 mil metros de asfalto a serem aplicados, fora as ruas internas no loteamento, que contará com 2,5 mil unidades, todas destinadas para o programa Minha Casa, Minha Vida, parte para quem recebe entre zero e três salários e outra para renda entre três e seis mínimos. 

Os arquitetos ainda falaram da geração de empregos, que irá auxiliar no desenvolvimento da região, lembrando que apenas 30% da área serão loteados, sendo o restante preservado ou entregue para uso do poder público. Escher assinalou que o projeto tem finalidade voltada para a habitação social e que “o território tem vocação urbana, muito embora o PDDUA não reconheça, apesar de já estar parcialmente ocupado com espaços urbanos, na contramão do que o PDDUA apresenta atualmente”.

Limites da Zona Rural

Ao finalizar, a vereadora Fernanda Melchionna (PSOL), que presidiu os trabalhos, defendeu a aprovação dos projetos apresentados pelo Executivo relativos à criação das Áreas Especiais de Interesse Sociais, que permitirão o avanço do processo de regularização fundiária de diversas comunidades já estabelecidas nas zonas Norte, Sul e Leste da Capital. Disse que se trata de uma situação bem diferente da mudança dos limites da Zona Rural, proposta em outras matérias, que estão voltadas à expansão da especulação imobiliária em detrimento da garantia e da preservação da sustentabilidade ambiental e da produção rural.

Fernanda sugeriu a realização de uma nova audiência pública específica para tratar os dois empreendimentos, em razão da ausência das comunidades do entorno desses projetos, cuja oitiva a parlamentar entende como fundamental. Disse que as ocupações são necessárias para dar a garantia de uso social para áreas que estão abandonadas há mais de 20 anos, como o Parque Industrial da Restinga. E que a prioridade é dar solução para quem já está sob essas áreas e não para empresas “cujo interesse é construir mais por menos, e sem qualquer fim social”. Por fim, a vereadora informou que a Prefeitura foi convidada e lamentou que nenhum representante do Executivo tenha sido enviado para participar do debate.

Grupo de Trabalho

Juliano Fripp, representante do Conselho Regional Pela Moradia Popular, lembrou as inúmeras reuniões feitas na Cuthab, no Orçamento Participativo e de um grande encontro com o ex-vice-prefeito para resolver o impasse gerado pelo veto do ex-prefeito José Fortunati no início de 2014, sob a alegação da ausência de audiência pública formal na tramitação do projeto original, de autoria dos vereadores Pedro Ruas (hoje deputado estadual) e Fernanda Melchionna, que havia sido aprovado por 33 vereadores em dezembro de 2013. “Foi nesse momento que resultou a criação de um grupo de trabalho, envolvendo diversas secretarias, que concluiu pela posição técnica favorável de 13 das 14 AEIS defendidas na proposta”, disse. “Depois de ver derrubado o veto, o prefeito entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, até hoje não julgada”, lamentou.

Fernando Campos Costa, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MSTS), criticou as diferenças entre os projetos discutidos na audiência pública. Disse que a lei é utilizada de maneira distorcida quando é para pobres ou para ricos. “Para a regularização fundiária, é uma dificuldade, mas, para transformar áreas de especulação em um filé, visando ampliar lucros de empresários, aí tem apoio”. Costa denunciou que as comunidades muitas vezes ficam reféns de advogados de grileiros ou de técnicos. Que o trabalho feito em conjunto com o Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) foi exemplar no grupo de trabalho. Criticou o Departamento Municipal de Habitação (Demhab) e disse que é preciso haver equilíbrio entre o capital, o governo e os cidadãos, “para que o Estado não siga capturado pelo poder da iniciativa privada, que usa o pobre como ponta de lança dessa forma de obtenção de lucro das construtoras”. 

O vereador Mendes Ribeiro (PMDB) também esteve na audiência pública.

Texto: Milton Gerson (reg. prof. 6539)
Edição: Claudete Barcellos (reg. prof. 6481)