Ex-preso que participou do filme Central critica o sistema penitenciário
Jorge Luiz de Oliveira Gomes criticou as condições das cadeias e a dificuldade de reinserção social.
O ex-apenado da Cadeia Pública de Porto Alegre (antigo Presídio Central) Jorge Luiz de Oliveira Gomes, protagonista do filme Central, produzido pela Panda Filmes, utilizou o período de Comunicações temáticas da sessão plenária desta quarta-feira (12/4) da Câmara Municipal para falar sobre as dificuldades enfrentadas pelos presos quanto à recuperação e reinserção ao convívio social após o cumprimento da pena. Gomes destacou que o sistema, como tal, está falido e não executa “nem de perto” o que está previsto na Lei de Execuções Penais (LEP).
Para ele, os presos têm um tratamento “pior que o dado a um animal”. Ele, que cumpriu pena por 20 anos e chegou a ser prefeito de galeria, disse que basta assistir ao filme para ver as condições das acomodações, alimentação, assistência saúde, educação, transporte, oportunidades de trabalho, apoio psicológico e outras necessidades básicas, e o porque do índice de reincidência ao crime (em vez da reinserção social) estar na casa dos 70%.
Gomes afirmou que gostaria de ver “apenas uma parte dos cerca de R$ 50 bilhões que são desperdiçados anualmente com a corrupção investidos no sistema carcerário, o que certamente traria um resultado diferente do que hoje torna os presídios conhecidos como uma escola do crime”. Para ele, quando menos de 2% dos apenados são letrados e mais de 98% são pobres e miseráveis, “só é possível constatar que a cadeia não foi feita para ricos”.
Vereadores
A presença de Gomes no plenário da Câmara, para divulgação do documentário cinematográfico Central, foi comentada pelos seguintes vereadores:
PREÇO - "Qual a saída para um apenado que está no Central?". Rodrigo Maroni (PR) fez esta pergunta ao destacar a presença de Gomes na sessão ordinária. Ele defendeu que a sociedade e os governos discutam de forma clara uma reforma penitenciária. "Quem entra como ladrão sai de lá como homicida", disse o vereador, ao falar sobre as estruturas internas de comando existentes na penitenciária, além da corrupção que rege as relações entre os apenados e a falta de programas para a reinserção social. "Gomes ficou metade de sua vida no presídio e pagou caro por isso", disse, ao revelar que o ex-apenado era policial no começo de sua vida profissional e que, ao sair, teve muita dificuldades em conseguir emprego. "Todos os que lutam por politicas públicas e sociais têm que dar exemplos de inserção", salientou ainda ao convidar a todos para assistir ao documentário. (HP)
LIVRO - Adeli Sell (PT) saudou a coragem e a determinação da diretora do documentário Central, Tatiana Sager, além da produtora Panda Filmes, incluindo Beto Rodrigues e Renato Dornelles, e lembrou o trabalho do juiz Sidinei Brzuska, da Vara de Execuções Criminais. "Não é de se admirar quando autoridades da área falam o que Gomes falou aqui", disse. Adeli também citou o livro Dos Delitos e das Penas, de Cesare Beccaria, publicado em 1764. "Antes desse livro, barbaridades eram cometidas com punições brutais. Passados tantos anos, o que se vê no Central é uma discussão pré-histórica", lamentou. ""Onde estão a dignidade das pessoas e seus direitos fundamentais", questionou. O vereador lembrou ainda que a maioria dos apenados do Central não tem condenação formada, e que apenas 10% responde por crimes de homicídios. "Jamais vamos defender qualquer questão que não seja a justiça, os direitos e os deveres. Mas não podemos ter uma condenação antes de um julgamento". (HP)
EDUCAÇÃO - Prof. Alex Fraga (PSOL) também citou o juiz Brzuska e lembrou que o magistrado, em oportunidade anterior na Câmara Municipal, revelou que a maioria dos apenados eram evadidos de escolas. "Isso me assustou e envergonhou", disse o vereador ao recordar que o juiz igualmente revelou que, a cada ano a mais em uma escola, era verificada uma redução nas possibilidades de um indivíduo ingressar no crime. "Os governos acreditam que educação implica gastos, há um descaso histórico com a educação no país. Faltam escolas e as poucas que temos estão ameaçadas", criticou. "Mas, se não revertermos essa dura realidade, se não for feito isso através da educação, da cultura e do esporte, o sujeito fica sem perspectivas e é atraído pela criminalidade", lamentou Fraga, que citou Darcy Ribeiro: "Se não forem construídas mais escolas, no futuro não haverá vagas nos presídios". (HP).
Texto: Milton Gerson (reg. prof. 6539)
Helio Panzenhagen (reg. prof. 7154)
Edição: Claudete Barcellos (reg. prof. 6481)