Audiência pública

Quantidade de agentes de saúde pauta debate sobre o PLCE 029/21

Lei federal prevê um agente de saúde para cada 750 pessoas. Vereadores e entidades acreditam que Porto Alegre precisaria de aproximadamente 1.300 profissionais.

  • Audiência Pública debate projeto do Executivo sobre manutenção de empregos de agentes de saúde.
    Ex-vereador Dr Goulart e Francisco Isaías (d) destacaram importância dos agentes de saúde nas comunidades (Foto: Ederson Nunes/CMPA)
  • Audiência Pública debate projeto do Executivo sobre manutenção de empregos de agentes de saúde.
    Secretário Mauro Sparta (e) recordou criação do Imesf e a contestação judicial que determinou a extinção do Instituto (Foto: Ederson Nunes/CMPA)

A Câmara Municipal de Porto Alegre debateu nesta terça-feira (14/12), em audiência pública realizada por videoconferência, o Projeto de Lei Complementar do Executivo nº 029/21, que autoriza o Munícipio a manter 351 empregos públicos de agentes comunitários da saúde, da Estratégia da Saúde da Família, e 81 empregos públicos de agentes de combate a endemias, do Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família (Imesf). A reunião foi coordenada pelo vice-presidente do Legislativo, vereador Idenir Crecchim (MDB).

O secretário municipal da Saúde, Mauro Sparta, retomou a história que deu origem ao Imesf, oficializado em 2011 e contestado por Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), que foi julgada procedente e culminou na determinação de extinção da entidade. Sparta explicou que, ao contrário da possibilidade avistada nos casos dos demais profissionais (médicos, enfermeiros, dentistas e pessoal administrativo) que tiveram seu vínculo extinto, há legislação federal e texto constitucional que vedam a terceirização ou contratação temporária de agentes comunitários de saúde e agentes de combate a endemias, salvo em casos de surtos epidêmicos. Assim, o Executivo precisa absorver, na sua estrutura, os profissionais. 

O titular da Saúde citou que, atualmente, há 420 agentes comunitários ativos no Imesf, sendo que os 148 profissionais admitidos pela Emenda Constitucional nº 51 (processo seletivo público) devem permanecer no quadro. “O agente comunitário de saúde deve, comprovadamente, residir no território de atuação. Os agentes não podem ser movimentados”, detalhou, acrescentando que, no último concurso, não houve aprovados para atender todos os territórios.  

Sobre a quantidade de profissionais estabelecida no Projeto de Lei, disse que o dimensionamento foi realizado com base na Política Nacional de Atenção Primária (PNAB), que preconiza que cada unidade de Estratégia de Saúde da Família (ESF) tenha, pelo menos, um agente. “Adicionalmente, tomou-se como referência o Índice de Vulnerabilidade em Saúde, que considera indicadores de suma importância para a saúde, como mortalidade infantil, crianças menores de um ano, taxa de mortalidade por Aids, entre outros. Esse índice foi usado de modo que unidades mais vulneráveis tenham mais agentes”, afirmou. Acrescentou, ainda, que o projeto foi elaborado tendo como referência o Decreto 21.005/21, que regulamenta o processo de extinção do Imesf.

Iranildo Lima da Costa Júnior, procurador do Município, destacou que, pela decisão judicial, todos os vínculos empregatícios do Instituto deveriam ser extintos e que  o instrumento adequado para o Executivo conseguir manter os agentes de saúde e de endemias seria uma lei complementar que trouxesse a regulamentação. Destacou que a manutenção dos agentes leva em conta o vínculo dos mesmos com os territórios, além de critérios de impessoalidade e isonomia.

Insuficiente

Priscila Matheus, advogada da Associação dos Agentes Comunitários de Porto Alegre, ressaltou que é necessário fazer alguns recortes sobre a fala do secretário de saúde e questionou o porquê de manter somente 351 agentes de saúde. “Como somente manter esse número no meio de uma pandemia?" Informou que agentes estão sendo demitidos e acrescentou que o Tribunal Regional do Trabalho determinou que cessem essas demissões. “Alguns agentes estão atendendo mais de 3 mil pessoas.”

A enfermeira Carolina Santana Krieger, que trabalha há 19 anos como agente da saúde da família, disse que foram apresentadas todas as alegações defendendo que o Imesf é mais barato para o governo municipal, sendo um trabalho de qualidade e reconhecido inclusive por outros municípios. “Hoje vivemos uma insegurança na atenção básica do município, pois, mesmo sendo concursados, estamos sendo avaliados por um contrato que ficará vigente somente por um ano. Queremos que o governo reconheça que isso é temerário, principalmente por estarmos entrando em uma nova cepa da covid-19, e isso é preocupante”, desabafa. 

Tiana Brum de Jesus, representando o Conselho Municipal de Saúde (CMS), disse que o projeto é uma proposta que vai contra o Sistema Único de Saúde (SUS). “É preciso respeitar os diálogos que foram feitos em diversas conferências, e nelas foi defendido o importante trabalho feito pelos agentes com as comunidades.” Ela reivindicou ainda o aumento de profissionais nesse projeto de lei e defende ajustes. “Pedimos um agente a cada 750 pessoas atendidas, conforme diz a lei, e que isso seja respeitado, precisamos de mais agentes.”

Ramiro de Castro, representando a assessoria jurídica do Sindicato dos Agentes de Saúde, disse que a construção do projeto foi árdua e, mesmo tendo conseguido alterar para que haja a permanência de 351 dos  servidores, isso ainda não contempla a categoria. “Sobre o vínculo dos profissionais, eram 552 que saíram através do processo Sei, e 60 já foram demitidos nesses últimos dias através de decreto ilegal. Enquanto mediações estão ocorrendo como se estivessem colocando uma faca no pescoço dos profissionais.”

Solução possível

Carlos Fett Paiva Neto, chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Saúde, destacou que, “na inviabilidade do Imesf, a gestão procurou um meio de manter a organização do SUS , especialmente nas comunidades mais carentes, que não têm outros meios para provimento de suas necessidades de saúde”. Defendeu que o projeto veio para reafirmar e manter o serviço à comunidade. "Realmente é uma equação bastante difícil, uma equação econômica complexa. Está se tentando, dentro do possível, que a Atenção Primária não se perca”, afirmou. 

O especialista em saúde Francisco Isaías fez um resgate da Estratégia de Saúde da Família, existente há duas décadas no Brasil. Citou que os agentes comunitários de saúde são os sucessores dos agentes pastorais de saúde, pessoas representantes da comunidade “que eram um braço da saúde quando ainda não existia o SUS” e que conseguiram reduzir a mortalidade fazendo o acompanhamento das famílias. Com relação ao projeto, disse que é preciso encontrar um caminho legal para legitimar essa importante atividade. Isaías participou da audiência pública acompanhado do ex-vereador Dr Goulart, que também reforçou a importância dos agentes comunitários.

Vereadores

Aldacir Oliboni (PT) citou que, em reunião com vereadores e servidores, o prefeito Sebastião Melo sugeriu a criação de um grupo de trabalho para verificar a necessidade de demissões, mas que o grupo não avançou e as demissões seguem ocorrendo. Ele apelou para que os 33 aprovados no concurso para agente de endemias sejam incluídos no projeto, elevando o número de cargos de 81 para 114. “Quem fez concurso deve ser chamado”, afirmou. Ele defendeu que o projeto seja alterado para também manter todos os atuais agentes comunitários de saúde até que se faça outro concurso ou se chamem os aprovados no concurso realizado no final do governo Marchezan.

Airto Ferronato (PSB) disse que tem acompanhando o processo de extinção do Imesf. “Temos os servidores e os aprovados no concurso público, e todos preocupados com a nomeação ou a permanência”, citou. Dizendo que o projeto chega em boa hora, afirmou que “é preciso fazer um esforço bastante grande no Executivo para evitar demissões, até em razão da própria pandemia que está se avizinhando mais uma vez”. “Sou favorável à permanência de quem lá está e à de quem foi aprovado no concurso”, enfatizou, acrescentando que apresentou emenda ao projeto para que as vagas remanescentes sejam ocupadas pelos concursados. 

Jonas Reis (PT) relatou visita ao Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul, onde havia apenas três médicos atendendo. “É empresa contratada, que recebe dinheiro da prefeitura e não cumpre o que está no contrato”, afirmou, referindo-se à empresa terceirizada que administra a unidade. Sobre o projeto em debate, disse que “não é problema nenhum manter os agentes que temos e contratar mais”. Citando que a lei estabelece um agente para cada 750 moradores, destacou que bairros grandes não podem contar com apenas um agente. “É errado economizar com esses trabalhadores. São necessários, e o recurso é quase todo federal”, afirmou, pedindo sensibilidade do secretário sobre o tema.

Respostas

Em resposta aos questionamentos dos servidores, o secretário Mauro Sparta afirmou que 351 agentes estão sendo levados para dentro da administração. Segundo ele, isso não significa que serão somente esses agentes na atenção primária. “Temos 45 territórios que ainda não têm agentes comunitários de saúde. Para esses locais não houve aprovado em concurso, por isso ainda vamos ter que fazer essa colocação para cobrir os demais territórios”, explicou. Sparta ainda completou afirmando que a lei não permite que se possa transferir o agente de um território para o outro.

Iranildo da Costa júnior complementou a fala ressaltando que, pela lógica da mediação, deve se levar em conta regras judiciais. “Nos preocupamos em não dar falsas esperanças aos servidores através de falsas reintegrações. Por isso é fundamental estar bem informado sobre o que propõe o projeto, pois a nossa intenção é de atender a todos de forma legal e coerente”, afirmou. Também estiveram presentes representantes da classe de saúde, servidores municipais e da sociedade civil.

Texto

Ana Luiza Godoy (reg. prof. 14341)
Priscila Bittencourte (reg. prof. 14806)

Edição

Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)

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