Cuthab

Relatório aponta problemas em obras do Minha Casa, Minha Vida

  • Reunião de encerramento e apresentação do relatório das atividades desenvolvidas pelo Grupo de Trabalho sobre as etapas do Projeto Federal Minha Casa Minha Vida e consequentes desdobramentos. Na foto, os vereadores Fernanda Melchionna (ao microfone) e Dr. Goulart.
    Fernanda Melchionna (PSOL) foi a relatora (Foto: Candace Bauer/CMPA)
  • Reunião de encerramento e apresentação do relatório das atividades desenvolvidas pelo Grupo de Trabalho sobre as etapas do Projeto Federal Minha Casa Minha Vida e consequentes desdobramentos.
    Comunidades apontaram problemas no cadastramento das famílias (Foto: Candace Bauer/CMPA)

Falhas estruturais nas construções - que ocasionam vazamentos, alagamentos, rachaduras, e outros danos às construções -, vícios de origem nos projetos e processos de seleção dos beneficiados e o abandono dos moradores por parte dos governos federal e municipal nas áreas da segurança, educação, saúde e transporte. Estes foram os principais pontos descritos no relatório do grupo de trabalho (GT) criado pela Comissão de Urbanização, Transportes e Habitação (Cuthab) da Câmara Municipal de Porto Alegre para analisar os empreendimentos do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) na capital gaúcha. O documento foi elaborado pela vereadora Fernanda Melchionna (PSOL), designada para relatoria da situação denunciada aos parlamentares pela comunidade em 1º de agosto passado. 

O relatório, cujo texto ainda não é definitivo, pois receberá adendos a partir do debate realizado na manhã desta terça-feira (19/12), no Anfiteatro Ana Terra, prevê que os pontos levantados pelas reuniões e visitas a quatro dos nove condomínios do programa implantados pelo MCMV, em Porto Alegre, sejam encaminhados aos Ministérios Públicos Estadual e Federal, à Caixa Econômica Federal (CEF); à prefeitura da Capital, assim como aos demais órgãos fiscalizadores e ligados, direta ou indiretamente, ao tema da luta pela moradia.

As diligências do GT foram realizadas nos condomínios Repouso do Guerreiro (Restinga), Camaquã (Camaquã), Ana Joaquina Gonçalves e Manoela Gonçalves (Partenon), onde, de acordo com o relatório, os problemas são muito parecidos. Entre os problemas estão os vícios construtivos, execuções inadequadas, materiais utilizados de qualidade suspeita, problemas de definição do que é espaço privado e público e dificuldade de comunicação com os órgãos responsáveis, especialmente com a CEF. O texto também indica particularidades de cada comunidade em relação a outros temas, como segurança, transporte, acesso à saúde e educação e questões sociais, que variam de acordo com a região geográfica onde se encontram. Neste caso, constata a relatora Fernanda Melchionna, os mais atingidos são aqueles condomínios que se localizam no bairro Restinga.

Problemas no cadastramento e seleção das famílias beneficiadas foram apontados pela representante da Comissão de Habitação do bairro São José, Elenira Martins. Ela reclamou que muitas pessoas cadastradas e dentro dos critérios, desde 2009, não foram contempladas. “Moradores de áreas de risco, cadeirantes, gente que é da região, foram deixados de lado, quando sabemos que tem pessoas de fora que receberam a moradia”, denunciou. O tópico deverá ser incluído no relatório final, de acordo com a relatora.

Planejamento

Eleonora Serralta, representando a Procuradoria Geral do Município (PGM), destacou a importância do planejamento em programas como o MCMV. “Questões de sustentabilidade, como a de temperatura ambiente e outras, podem ser resolvidas pelos arquitetos e engenheiros, contribuindo para a redução do consumo de energia, por exemplo”, disse, concordando que existe descaso por parte das empresas construtoras na idealização e execução dos projetos. No caso específico dos condomínios em Porto Alegre, disse que a PGM é responsável pela avaliação dos licenciamentos das obras e que, com base no relatório, irá fazer uma triagem das situações de competência do órgão para analisá-las com maior detalhamento.

Fabiano Silva Soares, engenheiro da Secretaria Municipal de Educação (Smed), afirmou que o município passa por uma situação financeira delicada, mas que há projetos para a construção de escolas para o atendimento dos moradores desses condomínios, especialmente nas localidades mais distantes de equipamentos já existentes. Sobre as críticas à qualidade das construções, ele disse que isso se deve à padronização nacional dos projetos, que limita em muito o uso de materiais. Mas reconhece, no entanto, que o sistema reduz o tempo de execução da obra. Ainda lembrou que no caso dos condomínios Recanto do Guerreiro (Restinga), a escola já está licitada, e no Ana Paula (Restinga) foi iniciada e interrompida por falta de recursos.

A superintendente de Ação e Cooperativismo do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), Maria Horácia Ribeiro, elogiou o trabalho da Cuthab. Disse que é preciso mobilização da sociedade em busca da correção dos vícios construtivos, inclusive judicialmente. Cobrou também posição sobre a venda de cadastros, “que estão aí, nas barbas de todos, com apartamentos sendo anunciados antes mesmo de serem entregues”.  

Horácia afirmou ainda que o trabalho técnico social tem sido feito pelo Demhab, mas que em alguns condomínios a equipe enfrenta dificuldades. “Como no São Guilherme, na Restinga, onde os servidores foram expulsos.” Ela também citou o exemplo de ação para a sustentabilidade, como a realizada no condomínio Belize, também na Restinga, onde há a separação de resíduos e, com o apoio do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), gera recursos para o pagamento da iluminação das áreas comuns.

Falta de recursos

No aspecto da saúde pública, Elmo Raupp, coordenador de projetos da pasta, reconheceu que a maior dificuldade está na falta de recursos para a edificação das unidades básicas de saúde. Disse que os projetos do governo federal contemplam apenas a área para a construção, mas que o custo da obra e de recursos humanos fica com o município. Ressaltou que esses equipamentos, quando em operação, não atenderão somente os moradores dos condomínios, mas também a população do entorno.

Síndica do Manoela Gonçalves, no bairro Partenon, Hipólita Honorina da Costa Oliveira, denunciou que a marginalidade está tomando conta dos condomínios e que a culpa é do Estado, “que não assume as suas responsabilidades com segurança, educação e saúde”. Reclamou da falta de orientação, especialmente aos jovens em situação de vulnerabilidade, da superlotação e falta de médicos nos postos de saúde para o atendimento da demanda. Também cobrou vazamento de informação pelo Demhab, de lista dos apartamentos com irregularidades por ela fornecido ao órgão. “O documento com a minha assinatura foi parar na mão de moradores, colocando eu e minha família em risco de represália”, lamentou.

Como encaminhamento, a vereadora Fernanda Melcchiona sugeriu a inclusão no texto do relatório dos problemas relatados com o cadastramento e seleção das famílias e da situação do transporte coletivo para a Restinga. Sugeriu um mutirão entre o Demhab e a CEF, que, apesar de convidada, não compareceu à reunião, para avaliar a situação das irregularidades de ocupações e nova destinação aos imóveis vazios. Também que a Smed forneça documento com dados precisos sobre os projetos e obras de escolas. Por fim, que em janeiro será feita a apresentação oficial do relatório final, com os adendos, para o posterior envio aos órgãos competentes: Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Prefeitura, Caixa Econômica Federal e outros.

Participaram do encontro, que reuniu outros síndicos, moradores, integrantes do governo municipal, representante da Defensoria Pública da União, além de Melchionna, os vereadores Dr. Goulart (PTB), que presidiu a primeira parte dos trabalhos, Paulinho Motorista (PSB), Gilson Padeiro (PPS), Roberto Robaina (PSOL) e Cassiá Carpes (PP).

Texto: Milton Gerson (reg. prof. 6539)
Edição: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)