Reforma Política

Voto em lista fechada divide opiniões

Evento discute mudanças no sistema político brasileiro Foto: Bruno Todeschini
Evento discute mudanças no sistema político brasileiro Foto: Bruno Todeschini

A implantação de voto em lista fechada numa futura reforma política está longe de ser um consenso entre políticos e cientistas políticos. No segundo encontro do Ciclo de Debates sobre a Reforma Política, realizado ontem à noite na Câmara Municipal de Porto Alegre, os deputados federais Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) e Vieira da Cunha (PDT-RS) e os professores da Ufrgs Benedito Tadeu César e André Marenco apresentaram visões diferentes sobre o voto em lista fechada. Ibsen é a favor. Marenco é contra. Vieira tem simpatia pela proposta. Para César, o importante é que o sistema funcione, seja ele qual for.

A favor

Ibsen Pinheiro sustentou que a reforma política é necessária porque o modelo político praticado no Brasil se baseia numa coabitação danosa entre dois institutos: o presidencialismo e o voto proporcional para os legislativos em lista aberta. Observou que tal sistema é de 1946. Ibsen traçou um comparativo entre o voto distrital e o proporcional. "O voto distrital produz estabilidade, maioria para governar, oposição consolidada e alternância restrita, mas tem um vício: exclui as minorias do processo político. No sistema proporcional, as minorias estão representadas, mas a pulverização resultante desta representação causa prejuízo à estabilidade e à governabilidade." Já o presidencialismo, segundo ele, tem se caracterizado pela cooptação dos partidos como forma de garantir maioria nos parlamentos aos governos.

Para Ibsen, o Brasil pegou o pior dos dois sistemas; o eleitor vota num nome que está numa lista, mas a lista dos eleitos é outra. O eleitor não sabe se o nome de quem ele votou vai estar entre os eleitos e, ao mesmo tempo, também não vota no partido. "Isso enfraquece a relação eleito/eleitor." Por isso, o deputado prefere o sistema de voto distrital misto, em lista fechada. "Dizem que a lista fechada seria o paraíso dos caciques, mas os caciques já existem e integram o atual sistema", afirmou ele, alertando que, se o atual processo for mantido, pode ameaçar a sobrevivência de nossas instituições.

Simpatia

Vieira da Cunha (PDT/RS) disse que ainda não está convencido, mas tem simpatia pelo sistema de voto em lista fechada com financiamento público. "O sistema atual não funciona principalmente por causa do abuso do poder econômico, que deforma o resultado e compromete a vontade do eleitor." Conforme Vieira, pelo voto em lista com financiamento público não haveria mais recursos utilizados pessoalmente pelos candidatos. "Os partidos é que usariam, de maneira coletiva, os recursos para as eleições. As campanhas seriam feitas pelos partidos, rompendo com o vício da campanha pessoal." Vieira ressaltou, porém, que o sistema de lista fechada tem dois pressupostos: voto direto dos filiados nas convenções para formação da lista e impedimento de que estas listas privilegiem os atuais detentores de mandatos.

Pelo melhor

O coordenador do Programa de Pós-Gradução em Ciências Políticas da Ufrgs, professor Benedito Tadeu César, observou que o sistema eleitoral de hoje teve origem em 1935. "O sistema proporcional com lista aberta nasceu com a ideia de favorecer a diversidade da representação. Mas, na verdade, não temos lista aberta." César concorda com Ibsen que na lista aberta "o eleitor tem apenas a ilusão de estar escolhendo um candidato, pois o voto dado em um acaba elegendo um outro candidato. Para ele, o melhor sistema é o que torna mais fácil ao eleitor a escolha, permite a fiscalização sobre o eleito, diminui os custos da eleição e possibilita aos eleitos governar de maneira estável com permanente crivo da cidadania e das instituições."

Contra

O professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Políticas da Ufrgs André Marenco se considera um defensor de sistema de lista aberta e um crítico da fechada. Disse que pesquisou 203 reformas em 93 países nos últimos 200 anos e observou que apenas um substituiu a lista aberta pela fechada: a Polônia, em 2001. Com a lista fechada, acredita que o Brasil passaria a ter eleitores de dois níveis, como na época do Império, onde os mais ricos escolhiam em quem votar para deputado: um tipo de eleitor escolheria quem seria o encarregado de votar por ele; o outro tipo é o que decidiria quem seria eleito. "Não devemos tomar modelos de outros locais e achar que a simples utilização deles em nosso contexto terá os mesmos resultados. "

O Ciclo é promovido pela Escola do Legislativo Julieta Battistioli e pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Políticas da Ufrgs. O evento terá mais três debates, dias 29 de junho e 2 e 5 de julho. A mediação do encontro de hoje foi do jornalista Ercy Pereira Torma, presidente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI).

Glossário

Lista fechada - Voto em lista fechada é uma modalidade de voto para eleição de parlamentares. Significa que o eleitor vota numa lista na qual a ordem de preferência dos prováveis ocupantes das vagas no legislativo é ordenada pelo partido, ou seja, o partido define quem será o ocupante da primeira, segunda, terceira cadeiras conquistas e assim por diante. Ao invés de votar no candidato individual para deputado ou vereador, o eleitor vota numa legenda, que distribuirá as cadeiras conforme o percentual de votos obtidos.

Lista aberta - É o sistema atualmente utilizado no Brasil. Os partidos definem uma nominata de candidatos e o eleitor escolhe livremente, votando individualmente no candidato que preferir. Os candidatos mais votados de cada sigla são eleitos, respeitando, porém, o número de cadeiras conquistado pelo partido, a chamada proporcionalidade.

Voto distrital misto - Neste sistema a metade das vagas para os parlamentos é distribuída pela regra proporcional e a outra metade, pelo sistema distrital. O eleitor tem dois votos para cada cargo: um para a lista proporcional (lista fechada) e outro para a disputa em seu distrito. O Estado é dividido em distritos eleitorais: regiões com aproximadamente a mesma população. Cada distrito elege um parlamentar e, assim, completam-se as vagas no Parlamento e nas Assembleias Legislativas. Dentro do sistema de voto distrital, a eleição é feita pelo processo de maioria absoluta, pode haver vários candidatos no Distrito e será eleito o mais votado. A isso, chama-se Sistema de Voto Distrital Misto.

Fontes: sites Política para Políticos (www.politicaparapoliticos.com.br) e Contraversão (www.contraversao.com.br)

Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)


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Ouça:
Reforma política deve conciliar listas aberta e fechada