Plenário

Frente em Defesa dos Povos de Matriz Africana é tema das Comunicações

Período foi destinado ao debate sobre garantia e expansão de direitos e respeito à cultura

Defesa dos povos tradicionais de Matriz Africana.
Tata Edson (d) lembrou do "holocausto da escravidão" (Foto: Matheus Piccini/CMPA)

A Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana foi tema do período de Comunicações Temáticas da sessão ordinária desta quarta-feira (14/12), na Câmara Municipal de Porto Alegre. O ato teve como orador principal o coordenador nacional de articulação política do Fórum de Segurança Alimentar e Nutricional e da Teia dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, Tata Edson.

“Mesmo com todas as riquezas constituídas por esse povo e suas consequências, me parece que os representantes legislativos não conseguem enxergar quem foram esses atores, que passaram pelo holocausto da escravidão”, declarou Tata. Segundo ele, alguns ainda enxergam o povo negro a partir da cor da pele, ao invés de tomar por base sua contribuição para a nação. “Somos cerca de 54% da população, por isso se faz necessário que nos vejam a partir de nossa contribuição histórica”, alegou.

Tata Edson disse ainda que a Frente Parlamentar é um objeto real para que haja conhecimento da cultura afro. “É preciso que a ignorância social seja dirimida, para que entendamos a importância dos povos de matriz africana, acabando com o preconceito com as ações como, por exemplo, o sacrifício de animais”, expôs. Por fim, o orador propôs a criação de uma CPI sobre o genocídio dos povos de matriz africana e a retomada da Frente Parlamentar no Legislativo municipal. “Isso nos colocará no centro dessa discussão, combatendo a falta de diálogo e de compreensão”, garantiu.

Expansão de direitos

Coordenador da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana na Câmara Municipal, Engenheiro Comassetto (PT) agradeceu aos vereadores e aos membros da sociedade civil participantes, afirmando que o trabalho foi centrado na garantia e expansão de direitos desses povos. “Lutamos para que direitos constitucionais conquistados não sofram nenhum retrocesso”, atestou. Comassetto ainda entregou à Mesa Diretora da Casa um relatório sobre as atividades realizadas pela Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana durante a atual legislatura.

Já o vereador Adeli Sell (PT) subiu à tribuna para se comprometer em seguir a luta do colega de partido, Engenheiro Comassetto, que não estará na próxima legislatura. “No ano que vem nós podemos levar adiante a Frente Parlamentar e vamos discutir com outros colegas vereadores que também têm militância contra o racismo e as questões que foram impostas aqui”. Da mesma forma, Sofia Cavedon (PT) assumiu o compromisso de lutar pelos povos de matriz africana dizendo que “nós temos o compromisso com a reparação histórica e com o reconhecimento do povo africano”, pois “não existe democracia quando ela é construída sobre uma base desigual como é a do nosso país”.

Na sequência, Tarciso Flecha Negra (PSD) afirmou que lutar pelo direito dos descendentes africanos é garantir que eles tenham o mesmo direito que todos os cidadãos que vivem neste país. “O Brasil nos deve muito, mas nós não queremos migalhas. Queremos igualdade”. O vereador também falou sobre a luta para que o Museu do Negro saia do papel e se torne realidade em Porto Alegre. “O Museu é um sonho e eu lutarei até o fim para que as crianças da cidade possam conhecer a verdadeira história do negro e não mais a mentirosa que há tempos se conta. Porque o negro não era um marginal, era um lutador por esse país”, encerrou.

Jussara Cony (PCdoB) concordou com a fala de Tata Edson de que "não devemos ser olhados pela cor da nossa pele, mas pelo que significamos no mundo do trabalho e no desenvolvimento do país. “Que essa Frente possa dar continuidade a essa inter-relação entre a comunidade e o legislativo na luta pelo reconhecimento dos direitos do povo negro e na busca por um mundo sem opressões", explanou.

Feriado

Professor Alex Fraga (PSOL) disse que lhe causava vergonha a decisão judicial que derrubou o feriado em comemoração ao Dia da Consciência Negra, aprovado pela Câmara de Porto Alegre no ano passado. Observou que metade dos feriados nacionais são religiosos cristãos. "A discriminação racial existe e é diária. A Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana precisa continuar, em 2017, trabalho iniciado nesta legislatura." Considerou uma conquista a instituição da lei que obriga as escolas a tratarem sobre a história da África, mas lamentou que os professores ainda não sejam preparados para trabalharem sobre este tema. "A academia é preconceituosa e fecha os olhos sobre a história das etnias que constituíram o país."

Delegado Cleiton (PDT) elogiou os debates feitos pela Frente Parlamentar e sua colaboração na luta pela dignidade, igualdade e respeito ao povo negro. "A Frente foi de extrema importância para o empoderamento do povo negro. Tivemos, no ano passado, uma batalha de cinco sessões debatendo a instituição do Feriado da Consciência Negra." Ele lamentou que a pressão econômica tenha tornado difícil a aprovação do projeto que instituiu o feriado e que o Tribunal de Justiça tenha depois anulado a decisão da Câmara a pedido dos lojistas. "Mas somos teimosos. Se não fôssemos teimosos, não aguentaríamos ter atravessado oceano acorrentados e maltratados. Resgatando nossos hábitos e culturas, não sobreviveríamos à grande injustiça do racismo. Vamos entrar com pedido para que a decisão do Tribunal seja reformulada."

Valter Nagelstein (PMDB) manifestou seu apoio ao movimento dos povos de matriz africana e à continuidade da Frente Parlamentar. Ressaltou que no Brasil, embora haja discriminações, felizmente há muitos imigrantes "e não tem ódios ancestrais como na Europa". Na questão racial, segundo ele, o Brasil não tem a mesma cultura dos Estados Unidos, onde há divisão muito evidente e os negros viveram em guetos durante muito tempo. "Toda discriminação é odiosa, viemos todos do mesmo lugar e voltaremos todos ao mesmo lugar. Sou brasileiro, neto de um judeu e de uma negra. É preciso educação para a tolerância e contra a discriminação." Defendeu que se projete um novo tempo a partir dos ensinamentos do passado. "A vida é sagrada e não tem cor, deve ser respeitada como tal. A história do povo negro é a história do país." (CS)

Airto Ferronato (PSB) disse ter tido a oportunidade de participar de algumas reuniões e debates da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana. Afirmou que o tema é importantíssimo e defendeu a continuidade da Frente na próxima legislatura. "O Brasil é uma mistura belíssima." Ferronato manifestou ainda o seu apoio às causas defendidas pelo povo negro  e à instituição do feriado em comemoração ao Dia da Consciência Negra em Porto Alegre, como sinalização de como pensa o porto-alegrense. "Todos temos um pouco da negritude nas nossas raízes e na nossa alma."

Texto: Paulo Egidio (estagiário de Jornalismo)
           Cleunice Maria Schlee (estagiária de Jornalismo)
           Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)
Edição: Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)