Comissão Especial

Empresários e vereadores defendem subsídios para o transporte coletivo

  • Oitiva com Consórcios MOB, VIVASUL,VIA LESTE, MAIS e CARRIS.
    Empresários afirmam que isenções impedem diminuição do valor da passagem (Foto: Henrique Ferreira Bregão/CMPA)
  • Oitiva com Consórcios MOB, VIVASUL,VIA LESTE, MAIS e CARRIS. Na foto, ao microfone, o vereador Cláudio Janta.
    Vereador Cláudio Janta (SD) é o relator da Comissão (Foto: Henrique Ferreira Bregão/CMPA)

A necessidade de que, para qualificar o sistema de transporte público de Porto Alegre, sejam identificadas novas fontes de financiamento junto ao governo municipal foi defendida pelas representações dos consórcios privados e, até mesmo, pelo diretor técnico da Companhia Carris, presentes à reunião da Comissão Especial que analisa o pacote de projetos do Executivo para o setor e que tramitam no Legislativo da capital gaúcha. O encontro ocorreu na manhã desta segunda-feira (27/11) e também concluiu que, para reconquistar os usuários, é preciso que medidas como essa, aliadas à redução e controle de isenções, ampliação do tempo de uso da frota, diminuição do número de cobradores e do tempo entre as viagens, e outras, reflitam imediatamente no valor da tarifa.

De acordo com os empresários do setor, poderia haver uma redução imediata de R$ 0,40, que levaria a tarifa, dos atuais R$ 4,05 para R$ 3,65. “Se pensarmos que existem mudanças, como é o caso do fim gradativo das isenções para quem tem entre os 60 e 64 anos, que levarão cinco anos para chegarem aos 100% de sua extinção, essa diminuição chegaria à R$ 1,00, e a passagem poderia cair para R$ 3,05. Isso faria Porto Alegre ter a tarifa mais barata entre as capitais brasileiras”, disse Antônio Augusto Lovatto, do consórcio Viva Sul.

Para Gustavo Simionovschi, diretor executivo da Associação dos Transportadores de Passageiros (ATP), a situação é grave e precisa servir de alerta, “antes que o sistema entre em processo de falência e a recuperação se torne muito difícil e danosa”, justifica. Ele informou que a crise, que já era real até o final do ano passado, com uma queda do número de passageiros pagantes, entre 2005 e 2016, em 23%, se agravou a partir deste ano com a consolidação do transporte por aplicativo. “Em 2017 a redução de pagantes já aumentou 11% e podemos fechar 2017 com 36% menos usuários pagantes a menos, valores que acabam sendo custeados pelos outros 64% que efetivamente pagam passagem”, falou ao justificar a necessidade de regulamentação dos aplicativos.

O diretor da ATP defendeu um a um os projetos do Executivo. Reiterou que os seus efeitos devem ser aplicados imediatamente para permitir a redução da tarifa e ser um atrativo para que os usuários retornem ao sistema. Simionovschi ainda lembrou que a adoção da segunda passagem tinha como concepção ampliar o número de passageiros, o que, efetivamente, segundo ele, não aconteceu.

O diretor técnico da associação disse também que a isenção para idosos entre os 60 e 64 anos não faz mais sentido, na medida em que há uma maior permanência no mercado de trabalho e o usuário tem direito ao vale-transporte. Ressaltou que, desde a implantação do benefício, a expectativa de vida na capital gaúcha passou de 62 para 75 anos.

Outro ponto que Simionovschi abordou foi o da isenção para professores e estudantes. “Professor tem direito ao vale-transporte e, portanto, tem maior benefício do que a redução de 50% na compra do vale. E a limitação por renda aos estudantes trará justiça social ao sistema, impedindo que jovens de famílias ricas usem o sistema de graça, fazendo com que os outros usuários pagantes arquem com essa conta”, declarou. Falou ainda da necessidade de penalização às fraudes, da limitação ao uso das isenções que permanecerem em vigor e da extinção gradual dos cobradores, lembrando os salários de motoristas e cobradores correspondem a 50% do custeio.

Carris

Em nome da Companhia Carris, o seu diretor técnico Flávio Caldasso Barbosa declarou que desde a implantação, há 37 anos, dos corredores de ônibus, nada mais foi feito para pensar a qualificação da mobilidade do sistema. Para ele, a demora das viagens é outro fator que leva à redução de usuários e se soma ao sucateamento de outros equipamentos, como paradas e terminais. Barbosa entende que o problema é de gestão e não de custeio. Recorda projetos que custaram valores consideráveis aos cofres públicos e não saíram do papel, como o metrô, os Portais da Cidade e, mais recentemente, os BRTs. Que a bilhetagem eletrônica é uma necessidade e que Porto Alegre já poderia ter avançado muito se tivesse enfrentado esse debate, assim como na área da educação para o trânsito, com a participação dos agentes da EPTC, que no passado auxiliavam o tráfego, o embarque e desembarque, entre outras importantes funções de controle do sistema.

Caldasso defendeu subsídios de recursos públicos para o sistema, o uso de novas e “eficazes tecnologias”, mas destacou que para isso é preciso construir formas de arrecadação. Para ele, o transporte coletivo por ônibus é essencial e faz parte das necessidades básicas de uma cidade do porte de Porto Alegre. “Devemos nos inspirar em exemplos de outros municípios brasileiros, e até de fora do país, que se utilizam da integração como uma ferramenta para otimizar as viagens e qualificar a mobilidade não apenas para os usuários do sistema, mas para todos os porto-alegrenses”, salientou.

O diretor técnico da Carris ainda fez referência a uma pesquisa na qual 20% dos entrevistados que deixaram o sistema não mais retornariam. Outros 20% a 30% voltariam, se o tempo das viagens fosse reduzido e houvesse maior flexibilidade entre linhas e trajetos e maior segurança. “A solução de transferir para a tarifa todo esse custeio vai quebrar o sistema”, disse, lembrando que a crise econômica, o desemprego, a informalidade e, consequentemente, a redução do uso de vale-transporte deve ser considerada nas análises. Por fim, que a demora em reposição de peças se deu pelo fim da validade dos contratos, lembrando que, no caso de uma empresa pública, os trâmites têm maior rigor no controle dos contratos, precedidos da necessidade de licitação ou de um árduo processo para provar a necessidade da sua dispensa legal.

Parlamentares cobram maior transparência da gestão

Roberto Robaina (PSOL) disse concordar com a necessidade de subsídio ao sistema, mas considerou que antes é preciso dar maior transparência aos números, planilha de cálculo tarifário, passageiros pagantes e outros, para evitar casos de corrupção como os que estão sendo vistos no Rio de Janeiro. Criticou o discurso do governo que, na sua opinião, leva ao descrédito da Carris e leva a companhia, que é referência em qualidade para o sistema, a perder credibilidade junto ao usuário. Também que os trabalhadores das empresas devem ter maior participação no debate.

Aldacir Oliboni (PT) reiterou que é preciso investir na formação de um fundo para subsidiar o sistema e que, se hoje é dito que a prefeitura aporta R$ 50 milhões ao ano na Carris, esse valor deveria ser maior. Criticou o sucateamento da Carris, como forma, segundo o parlamentar, de incentivar a sua privatização, conforme discurso público do prefeito Marchezan. Oliboni pediu informações sobre CCs na Carris. Também se disse contra a utilização de terminais, no que se referiu à baldeação das linhas. E que elas aumentam em uma hora viagens que levavam 30 minutos, como no caso do deslocamento do bairro Agronomia ao centro da cidade. 

Cassiá Carpes (PP) disse que é provável que o relatório da comissão seja aprovado por maioria, mas que, no plenário, que é soberano, o debate seja mais intenso. Cobrou do governo maior diálogo e menos imposição da vontade do prefeito. Declarou que se, por um lado, a Câmara, em algum momento, aprovou as leis das isenções, a gestão do sistema é de inteira responsabilidade do governo. Cobrou o uso de argumentos falsos, como o de que a aplicação de recursos no transporte retirará direitos da saúde. “O orçamento da saúde nada tem a ver com o do transporte. Aliás, se apenas se cumprisse o orçamento, que tem sido uma peça de ficção, talvez fosse o suficiente para a garantia dos investimentos necessários”, disse o vereador.

Cassiá ainda cobrou a democratização dos relatórios da Carris e lembrou, no caso dos aplicativos, que em breve estes também não sustentarão os valores praticados atualmente, o que resultará no regresso de usuários para o sistema coletivo. Por fim, sugeriu emenda que determine a revisão anual do sistema de transporte, devido à rapidez das mudanças do mercado.

Reginaldo Pujol (DEM), presidente da Comissão, disse, em resposta a Robaina, que todos serão ouvidos e na sequência dos trabalhos serão chamados os usuários, estudantes, trabalhadores e outros interessados. Pujol disse ainda que o subsídio já existe e a questão é definir qual a forma ele terá para reduzir as desigualdades para pagantes e não pagantes.

Alvoni Medina (PRB) voltou a manifestar a necessidade de que sejam abertos os números referentes às isenções de idosos e portadores de deficiência. Para ele, esses benefícios atingem duas categorias de cidadãos que necessitam do transporte para tratamentos de saúde e até mesmo para passeios que fortalecem a sua autoestima. Medina disse que o corte de garantias aos idosos, por exemplo, pode corresponder à perda de direitos para quem ainda produz e contribui para o desenvolvimento econômico da Cidade por necessidade de sobrevivência.

Já o relator Cláudio Janta (SD) apontou que valores apurados nas taxas do transporte por aplicativos, multas e estacionamentos rotativos poderiam ser aportados em um fundo de financiamento público do sistema. “Temos que discutir algumas isenções, mas é preciso pensar o transporte público na sua totalidade, envolvendo todos os modais e, a exemplo do que ocorre em todo o mundo, subsidiar a qualificação do sistema”, disse Janta. O relator ainda pediu que a Carris apresente os estudos e pesquisas disponíveis, como no caso das fraudes apuradas pelo governo e sobre a situação atual do sistema. 

A reunião foi presidida pelo vereador Reginaldo Pujol. O próximo encontro deverá ouvir entidades estudantis e outras instituições ligadas aos usuários que sofrerão perdas com os projetos apresentados pelo Executivo. No encontro desta segunda-feira, ainda participaram da reunião representantes da Associação dos Transportadores de Lotações (ATL) e do consórcio Mais Via Leste.

Texto: Milton Gerson (reg. prof. 6539)
Edição: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)